VÍDEO: Entenda por que a maré alta invade ruas de Paraty


Entenda por que a maré alta invade ruas de Paraty
Paraty (RJ), cidade histórica tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e reconhecida como Patrimônio Mundial da Unesco, tem um traçado urbano curioso. As águas do mar invadem algumas ruas do Centro Histórico em determinados períodos do mês.
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O assunto ganhou repercussão depois que um perfil republicou o post de outra página na rede social X (antigo Twitter). Até esta sexta-feira (25), a publicação já tinha 2,5 milhões visualizações.
O post, que mostra um vídeo da maré alta invadindo as ruas, chamou a atenção de muitas pessoas. Tem comentários apelidando a cidade até de “Veneza do Brasil”. O fato despertou a curiosidade dos internautas sobre o por que disso acontecer.
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O fenômeno só acontece por conta de um projeto arquitetônico e astronômico planejado ainda no século XVIII. Segundo o historiador Gunnar Sotero, as ruas mais baixas e inclinadas foram projetadas de forma que a maré alta pudesse invadir lentamente o calçamento.
“A projeção das ruas feitas de forma inclinadas permitia que a maré, composta de água salgada, invadia as ruas e permitia a limpeza, uma vez que, nos séculos XVII e XVIII, os serviços de saneamento básico, como esgoto e limpeza, eram inexistentes ou precários”, explica Sotero.
Desenho urbano do Centro Histórico foi projetado para que a maré entrasse nas ruas e ajudasse na limpeza
Divulgação/Gunnar Sotero
O evento, chamado de marés astronômicas, ocorre principalmente durante as luas cheia e nova, resultado do alinhamento entre o Sol, a Lua e a Terra, combinado aos ventos e à topografia baixa da cidade, que permitem o avanço da água pelas pedras.
“Deve-se observar que as ruas de Paraty que recebem as águas da maré são de pedras, com uma inclinação em forma de calha, o que facilita o escoamento da água nos dois sentidos, permite uma drenagem a autolimpeza das ruas, um controle de doenças, e isso tudo em acordo com a arquitetura e o patrimônio histórico e cultural.”, complementa o historiador.
Herança histórica
A prefeitura de Paraty confirma que o fenômeno não representa um problema urbano, mas sim uma herança histórica.
A água que entra nas ruas vem diretamente do mar e, ao recuar, mistura-se com a água do rio Perequê-Açu, formando um fluxo salobro — mistura da água do mar e do rio. Esse movimento ajuda a manter limpas as pedras originais do século XVIII, ainda preservadas em boa parte do Centro.
Centro histórico de Paraty no passado visto de cima
Reprodução
A prefeitura afirma que não há dados específicos sobre turistas que visitam Paraty exclusivamente por causa da maré, mas destaca que o fenômeno se tornou um dos símbolos mais fotografados e compartilhados da cidade.
“Geralmente, quem presencia essa cena o faz por sorte. O fenômeno acontece em dias e horários específicos, e não é previsível para a maioria dos visitantes. Ou seja, não costuma ser o principal motivo da visita, mas sim uma surpresa agradável que enriquece a experiência em Paraty”, informou a Prefeitura.
A maré atinge com mais frequência a Rua da Praia, o Largo de Santa Rita, a Rua Dona Geralda e trechos da Praça da Matriz, especialmente durante as chamadas “super marés”. As casas do Centro Histórico foram construídas com uma elevação de cerca de 30 centímetros em relação ao nível da rua. A estratégia evita que a água entre nos imóveis.
Não representa riscos
Apesar de não ser tratada, a água que invade as ruas não apresentam riscos graves à saúde, segundo a prefeitura.
“Embora o sistema de esgotamento sanitário da cidade ainda não esteja 100%, a Prefeitura de Paraty já está em fase avançada com o Governo do Estado para a liberação de recursos destinados à obras de saneamento básico, o que deve representar um grande avanço para o município e centro histórico”, explica o poder público municipal.
Ainda de acordo com a administração pública, não há registro de problemas de saúde causados pelo contato pontual com água.
A prefeitura orienta ainda que “o contato direto não é recomendado para pessoas com feridas abertas, baixa imunidade ou crianças muito pequenas.”
Imóveis foram construídos a 30 centímetros em relação ao nível da rua. Estratégia evita que entrada da água.
Divulgação/Gunnar Sotero
História do turismo na cidade
A história de Paraty, no litoral sul do Rio de Janeiro, região conhecida como Costa Verde, é marcada pela presença indígena e pelos primeiros contatos com navegadores europeus ainda no século XVI. Antes da chegada dos colonizadores, o território já era ocupado por povos originários como os Guaianás, Tupinambás e Tamoios, que estabeleceram trilhas ligando o litoral à região do Vale do Paraíba.
O historiador Gunnar Sotero, conta que logo após o “achamento” do Brasil, o litoral fluminense começou a ser navegado e mapeado por expedições portuguesas.
Ainda de acordo com o historiador, embora a ocupação do território remonte ao século XVI, foi apenas em meados do século XVII que a comunidade local começou a se organizar politicamente. Entre os anos de 1596 e 1597, moradores da região iniciaram um movimento para conquistar a autonomia em relação à Vila de Angra dos Reis.
Paraty foi elevada à condição de vila em 1667. Por meio de uma carta régia assinada por D. Afonso VI foi criada a Vila de Nossa Senhora dos Remédios de Paraty, marco oficial da fundação administrativa do município.
A partir daí, Paraty passou a se desenvolver como um mercado importante no ciclo do ouro, ampliando o papel econômico e estratégico na região sudeste do Brasil colonial.
O potencial turístico e cultural passou a ser explorado a partir da década de 1960, quando hotéis, pousadas e roteiros começaram a transformar o município em um dos destinos mais procurados do estado. No entanto, o fenômeno da maré não foi projetado para o turismo, e sim para as necessidades básicas de uma cidade colonial.
Hoje, quem caminha pelas ruas alagadas, muitas vezes de chinelos ou com os sapatos nas mãos, ajuda a manter viva essa tradição que une funcionalidade, história e beleza em um só cenário.
Centro histórico de Paraty
Reprodução
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