
Trabalhadores da 25 de Março: ‘Trump não aguentaria um dia de trabalho aqui’
“A rotina é essa. Sol e chuva, e tem que garantir o das crianças”, é como o comerciante Renato Diogo de Oliveira, de 38 anos, resume a rotina de trabalho na rua 25 de Março, o maior centro comercial da América Latina.
Com mais de três mil lojas funcionando na região, a 25 de março recebe diariamente 200 mil pessoas, segundo dados de 2025 da União dos Comerciantes.
Conhecido como um dos maiores mercados de atacado e varejo Brasil e na América Latina, a região foi citada em uma investigação comercial contra o Brasil por ordem do presidente norte-americano Donald Trump.
Em entrevista ao g1, a empresária Verônica Hye Hyun Ryou diz: “Todo lugar tem gente honesta, como tem malandro. Mas ele não pode generalizar”. Há 18 anos ela é proprietária de uma loja de bijuterias localizada na Ladeira Porto Geral, onde trabalha de segunda à sexta-feira, das 8h às 17h.
“A gente recolhe imposto. Trabalhamos tudo certinho. O que o Trump tem a ver aqui com o território brasileiro?”
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Manifestação organizada pelo Sindicato dos Comerciários de São Paulo na região da Rua 25 de Março, no centro de São Paulo, nesta sexta-feira, 18 de julho de 2025.
EDI SOUSA/ATO PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO
“O Brasil é um dos melhores países, que acolhe todo tipo de raça, todo tipo de pessoa”, afirmou um “chamador”, como são conhecidos os trabalhadores informais que ficam na porta das lojas convidando os clientes a entrar.
“Eu sou angolano. Não tenho emprego fixo. Mas aqui eu ganho meu pão. Nessa loja pagam R$ 100 por dia e tenho direito de almoço.”
“O Trump tem que ficar mais ligado no que rola aqui, porque a gente é do bem”, protestou no microfone a comerciante Elizabeth, vestida em trajes de festa junina, entre um anúncio de uma promoção e outra.
“Eu indicaria uma loja para ele trabalhar. Ele tem que ocupar a mente onde a gente ganha dinheiro, sobrevive e põe o Brasil para andar”, aconselhou a lojista, mesmo acrescentando que não acreditava que ele daria conta da rotina.
Comerciantes e clientes foram unânimes na visita ao local feita pelo g1 na quinta-feira (17): ‘Trump não aguentaria um dia de trabalho na 25 de março”, afirmou Renato Diogo, que há dez anos trabalha na região. ‘Nesse sol quente? Nem pensar!’
“Não vamos ser hipócritas falando que ele conseguiria’, acrescentou a professora de canto Marilda, uma das clientes da loja de Verônica.”
“Com o dinheiro que ele tem acho difícil que ele consiga voltar a essas raízes. Ele ganhou 1 milhão de dólares do pai para começar o próprio negócio. Então é difícil, né?”
A percepção da empresária é compartilhada por outros trabalhadores da região, que mobilizaram nesta sexta (18) uma manifestação “em defesa dos empregos, do comércio, do PIX e da soberania nacional”.
Manifestação organizada pelo Sindicato dos Comerciários de São Paulo na região da Rua 25 de Março, no centro de São Paulo, nesta sexta-feira, 18 de julho de 2025.
EDI SOUSA/ATO PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO
Brasileiros ‘invadem’ perfil de Trump e dominam comentários
Como é a investigação?
Trump já havia sinalizado o início da investigação na mesma carta em que anunciou a tarifa de 50% sobre exportações brasileiras, em resposta ao julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por tentativa de golpe de Estado.
No documento, divulgado pelo governo americano, a região da Rua 25 de Março é apontada como um dos maiores mercados de produtos falsificados do mundo, permanecendo assim há décadas, apesar de sucessivas operações policiais.
“O Brasil adota uma série de atos, políticas e práticas que aparentemente negam proteção e aplicação adequadas e eficazes aos direitos de propriedade intelectual. Por exemplo, o país não conseguiu combater de forma eficaz a importação, distribuição, venda e uso generalizado de produtos falsificados, consoles de videogame modificados, dispositivos de streaming ilícitos e outros dispositivos de violação”, afirma o documento.
Na avaliação do USTR, a falsificação persiste especialmente na 25 de Março devido à ausência de sanções, penalidades e medidas que desestimulem essa prática ilegal a longo prazo.
Não é a primeira vez que o maior polo de comércio popular da América Latina é alvo de críticas pelos EUA.
Em janeiro, um relatório do USTR já apontava como pontos de pirataria em São Paulo: o Centro Histórico e os bairros de Santa Ifigênia e Brás, incluindo o Shopping 25 de Março, Galeria Page Centro, Galeria Santa Ifigênia, Shopping Tupan, Shopping Korai, Feira da Madrugada e Nova Feira da Madrugada.
Segundo o relatório, as marcas originais veem a região como um “dos maiores mercados de atacado e varejo de produtos falsificados no Brasil e na América Latina, com mais de mil lojas vendendo produtos falsificados de todos os tipos”.
As empresas donas dos direitos sobre os produtos, alvo de falsificação, também afirmam que os mercados da Rua 25 de Março atuam também na distribuição de itens falsificados e pirateados para outras partes do Brasil.
Procurada, a Associação Representativa do Comércio da Região da 25 de Março (Univinco25) afirmou que reúne mais de 3 mil estabelecimentos formais, cujos produtos comercializados são importados da China, principalmente, e não têm relação com os Estados Unidos.
“É importante destacar que, embora existam pontos isolados onde há comércio irregular, como pirataria, em algumas galerias específicas, essas práticas são continuamente fiscalizadas e combatidas pelos órgãos públicos competentes. Esses casos não representam a imensa maioria dos lojistas da região, que atuam de forma legal e transparente”, informou em nota.