
Magna Moraes está se recuperando após transplante de rim doado por amigo ciclista
Magna Moraes/Arquivo pessoal
Aos 58 anos, a professora de geografia Magna Moraes vive uma nova fase da vida após enfrentar uma longa jornada marcada pela insuficiência renal crônica, sessões de diálise e um transplante. O procedimento, realizado em Juiz de Fora, aconteceu graças à generosidade de um amigo.
Quatro meses depois, a vida dela ganhou novo significado, com a retomada de uma rotina que não pôde ser seguida por 10 anos. Já Gilliard Barbosa Machado, que também precisou interromper algumas atividades devido aos pós-cirúrgico, celebra o laço eterno de união entre os dois.
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Neste domingo (20), Dia do Amigo, o g1 conta a história dos dois, que colocaram em prática o mais forte conceito de amizade, que, inclusive, pode transformar — e salvar — vidas.
10 anos de espera e incompatibilidade familiar
Diagnosticada com insuficiência renal em 2014, Magna enfrentou uma década de luta até o transplante. “Meus pés começaram a inchar, não cabia mais calçado. Usava só chinelo. Foi aí que descobrimos a falência dos rins com os exames”, contou.
O tratamento foi, inicialmente, conservador, para retardar a progressão da doença e controlar os sintomas, mas, em 2023, o nefrologista alertou que era hora de buscar um rim para o transplante.
O diagnóstico definitivo chegou em fevereiro de 2024 quando, já sem condições para enfrentar uma cirurgia, Magna teve que iniciar a hemodiálise.
“Foi o momento mais triste da minha vida, porque eu nunca esperava passar por isso. Sentia muita dor, passava muito mal, de precisar ficar internada, e perdi tudo o que conseguia fazer”.
Com a rotina de três sessões semanais de hemodiálise, perda de mobilidade e afastamento das atividades voluntárias no grupo de ciclismo que participava, a esperança parecia cada vez mais distante. Segundo ela, o terço que levada para rezar nas sessões era pedindo por um milagre.
Irmãos e filhos da professora, natural de Volta Redonda (RJ), tentaram ser os doadores, mas nenhum era compatível, por questões de idade e problemas de saúde. Mesmo assim, Magna se manteve firme, sempre orando e cuidando da saúde, acreditando que sua hora iria chegar.
‘Anjo doador’ no ciclismo
Em dezembro de 2024, durante uma campanha de arrecadação de fraldas para uma colega acamada, promovida pelo “Bike Anjo VR”, grupo voluntário que ensina pessoas de todas as idades e deficiências a andar de bicicleta, reencontrou Gilliard, um amigo de longa data.
Ele também estava afastado do projeto por conta da conclusão da faculdade de geografia e, ao descobrir que Magna precisava de um rim, não hesitou: “Eu tenho dois. Vou te dar um”, lembra Magna, muito emocionada.
Magna, de azul, com Gilliard, de amarelo, juntamente de outros voluntários do projeto Bike Anjos
Magna Moraes/Arquivo pessoal
Para o ciclista, tudo o que aconteceu naquele dia foi como um empurrão do destino, colocando-os no mesmo lugar e na mesma hora.
“Na sexta-feira, trabalhei até 22h em Barra Mansa, onde moro — a 30 km de Volta Redonda, cidade que fica a sede do Bike Anjos. No sábado, acordei com uma preguiça enorme de ir até lá. Mas eu tinha prometido que iria, então fui. Peguei a bicicleta e, no caminho, o pneu furou duas vezes. Ainda quebrei meu celular. Tinha mil motivos para desistir e voltar para casa. Mas segui em frente. Quando cheguei, escutei a Magna conversando com um amigo sobre o transplante.”
O que poderia parecer apenas uma coincidência, segundo ele, se tornou um chamado. A decisão de doar um rim, mesmo sendo algo tão sério e definitivo, nasceu naturalmente.
“Fiquei pensando naquilo por 3 dias, mas depois acordei com a certeza de que era eu quem devia doar. Não suportava a ideia de perder minha amiga. Já perdi pessoas importantes e sei como dói. Então peguei o telefone e liguei pra ela.”
Magna achou que era brincadeira, mas poucos dias depois, atendeu a ligação que mudaria sua vida e a tiraria da diálise. “O rim já é seu, só estou guardando aqui no meu corpo. Só falta tirar daqui”, relembra ela emocionada sobre o que Gilliard falou no celular.
Doação permitida pela Justiça
Os dois fizeram exames pelo SUS na Santa Casa de Misericórdia de Juiz de Fora sem contar para ninguém. Para surpresa de todos, eram compatíveis, mesmo sem nenhum grau de parentesco.
“Lembro que sentia tanto medo, mas, ao mesmo tempo, estava tranquilo. A cada 15 dias eu tinha que voltar a Juiz de Fora e todos os exames estavam dando certo. Eu percebi que a saúde voltava para o rosto dela, que ficou mais alegre. Tinha certeza que ia ser compatível quando o primeiro exame deu positivo”, contou Gilliard.
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A última etapa era a autorização judicial, pois a doação de órgãos entre vivos é permitida pela lei brasileira, mas com restrições quando não há relação de parentesco. O processo avançou com uma agilidade surpreendente, e o juiz autorizou o procedimento em menos de 4 horas — o que poderia ter demorado mais de um mês.
A cirurgia foi marcada para o dia 27 de março. “Ganhei meu rim numa quinta-feira. Foi o dia do meu milagre. Amizades salvam vidas”, contou Magda emocionada.
Ela lembra que, além de Gilliard, André, outro voluntário do projeto, também se ofereceu para doar caso fosse necessário.
“São gestos assim que mostram que a bondade ainda existe. Meu caso é prova de que existe amor além do sangue.”
Expectativa pela retomada da rotina
Depois do procedimento, Gilliard ficou um mês na casa de Magna, com a família dela cuidando dos dois, já que ele mora sozinho. “Hoje ela me liga todo dia para saber se eu tô bem, se preciso de alguma coisa, se as minhas contas estão pagas. A família dela tem um carinho enorme por mim.”
Magna segue em plena recuperação, já voltou a caminhar e em breve voltará ao pilates, à sala de aula, a dirigir e ao projeto de ciclismo. “Recentemente estive em Juiz de Fora e a médica me disse que meu rim está ‘voando’. Foi a melhor notícia.”
Magna se recupera do transplante em casa ainda sem poder voltar ao trabalho, mas já fazendo caminhadas e encontrando amigos
Magna Moraes/Arquivo pessoal
Já o ciclista diz que a ficha ainda não caiu e ele ainda se sente surpreso por ter doado um rim.
“Acho que foi uma obra de Deus mesmo, porque eu sempre peço para ser uma pessoa melhor. Fui um instrumento de um milagre. Estou muito orgulhoso e feliz pela vida dela, espero que viva bastante e ela virou uma amiga eterna, minha parceira de profissão.”
O próximo passo é Gilliard ser liberado para voltar ao trabalho na fábrica de reciclados e poder praticar exercícios como ciclismo. Ele também aguarda com expectativa a formatura na faculdade, prevista para o fim do ano, para poder dar aulas de geografia, tal como Magna.
“Muita gente pode doar, mesmo sem ser parente. Só é preciso querer e ter fé. Deus me mandou um rim pelas mãos de um amigo. Não é só a medicina que salva, é o amor ao próximo”, destaca Magna.
*estagiária sob supervisão da editora Juliana Netto.
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