
História da Festa do Peão de Barretos começou com rodeio em cavalos
Na edição que começa na próxima quinta-feira (21), a Festa do Peão de Barretos deve pagar R$ 385 mil só no Rodeio Internacional. Outros R$ 100 mil e uma caminhonete estão reservados ao vencedor da final brasileira da Professional Bull Riders (PBR).
A mãe de todas as festas de peão do país distribui hoje R$ 1,4 milhão em prêmios em nove modalidades, cifras de encher os bolsos dos competidores. Mas, em 1956, a primeira edição do Barretão teve um pódio diferente. Troféus eram entregues aos peões como reconhecimento pelo desempenho.
Com a festa ganhando fama ao longo dos anos, a situação melhorou. Em 1973, com a entrada do primeiro patrocinador, o vencedor do rodeio em cavalos, prova que era sucesso na época, levou um Fusca para casa. O prêmio era inédito no Brasil.
A montaria em touro que leva peões a encarar animais de até uma tonelada só chegou a Barretos 12 anos depois e sem prestígio. Uma TV 14 polegadas foi dada ao vencedor (veja mais detalhes abaixo).
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Este conteúdo integra a série especial do g1 ‘Barretão na Raiz’, sobre os 70 anos da Festa do Peão de Boiadeiro de Barretos, considerada o primeiro evento do gênero no Brasil e o maior da América Latina. As reportagens voltam no tempo para contar fatos curiosos das primeiras edições.
Anibal de Araújo foi o primeiro campeão da Festa do Peão de Barretos em 1956
Acervo Os Independentes
Cavalo como protagonista
Quando o clube Os Independentes fundou a Festa do Peão de Boiadeiro de Barretos há 70 anos, a competição oficial foi o cutiano. A modalidade em cavalos só existe no Brasil e surgiu das disputas entre peões de comitivas que, nas horas vagas, tentavam montar os animais que não aceitavam a doma.
🔎 No cutiano, o peão segura a corda com uma das mãos, e a outra fica livre, sem poder tocar em nada. O movimento das pernas do competidor é feito em direção a alça do arreio, de acordo com o pulo do animal. Pontua quem conseguir parar no lombo do bicho por oito segundos.
Aníbal de Araújo foi o primeiro vencedor do cutiano de Barretos, no Recinto Paulo de Lima Correa. De olho na profissionalização do segmento, Jorge dos Santos fundou a Marca Estrela, considerada a pioneira entre companhias de cavalos dedicados às provas.
Em 1969, um jovem de 18 anos, natural de Jales (SP), começou a demonstrar habilidade com cavalos. Encantado com o cutiano, Laurindo Bernardes queria ser competidor, mas o pai temia que o filho acabasse levando a pior para algum cavalo indomável.
Laurindo Bernardes foi competidor do cutiano, o rodeio em cavalos, de 1969 a 1982
Érico Andrade/g1
Ele, que já trabalhava na roça, acabou pegando prática quando se mudou para o Paraná, contratado por uma família para amansar uma tropa.
“O fazendeiro disse pra mim: ‘Laurindo, o cavalo que é bom para o campo você amansa pro campo. O que é bom pra pular você deixa aí pra você aprender a montar no rodeio, porque um dia você ainda vai ser campeão lá em Barretos”, lembra.
Laurindo seguiu o conselho do patrão. Competiu e venceu rodeios em Paranavaí, Loanda, Londrina, Curitiba, Umuarama, Campo Mourão, todas cidades do Paraná. Em julho de 1970, chegou a Barretos para fazer a inscrição e montar na Festa do Peão.
“Você tinha que ter sido campeão em algum lugar e, assim, eu já tinha um currículo. Eu fui falando pra comissão e eles gostaram do meu jeito, de ser franco. Fizeram minha inscrição e eu já ganhei quarto colocado.”
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Um prêmio de encher os olhos
Finalmente, o peão conquistou o lugar mais alto do pódio em 1971 e entrou para a galeria dos vencedores. Aquela altura, a Festa do Peão já atraía empresas interessadas em colocar sua marca no evento.
Foi aí que, em 1973, ao tornar a vencer o cutiano, Laurindo faturou um prêmio inédito no rodeio do país.
“Era o primeiro carro no Brasil que estava dando, era um Fusca. Eu fui receber em São Paulo, na Volkswagen. O presidente mostrou tudo como fazia o Volkswagen e aí ele mandou na cegonha pra mim. Eu recebi em Jales. Fizemos um grande desfile, porque naquela época eu representava Jales. Carta eu não tinha. Depois que eu tirei a carta”, diz.
Laurindo Bernardes dentro do Fusca que ganhou em 1973 na Festa do Peão de Barretos
Acervo Os Independentes
Transição para o touro
Em Paulo de Faria (SP), um jovem aspirante à carreira de engenheiro agrônomo também era apaixonado pela montaria, mas gostava de desafiar bois. Sebastião Procópio Ribeiro cresceu montando bezerros. O pai organizava rodeios na cidade, mas, assim como Barretos, o forte mesmo era o cutiano.
A montaria em bois até existia nos anos 1970. Ela era no estilo sorfete, com os peões segurando a corda com as duas mãos.
Um encontro em 1979, no entanto, seria um divisor de águas na vida de Tião Procópio e do rodeio no Brasil. Um competidor chamado Romildo Barbosa Santiago tinha acabado de voltar dos Estados Unidos e contou a ele tudo sobre a montaria em touros que era praticada no país.
“Aí eu fiquei vidrado naquilo, nos Estados Unidos tem. Eu estava morando em São Paulo, fazendo cursinho para prestar vestibular, eu ia fazer agronomia. Aí eu parei com tudo e falei: ‘não, eu vou para os Estados Unidos’”, conta.
Tião Procópio foi um dos responsáveis por implementar a montaria em touros no estilo americano no Brasil
Érico Andrade/g1
Tião comprou a passagem e se matriculou em uma escola na cidade de Hayward, na Califórnia. Ela era especializada em rodeios. Os alunos treinavam em animais maiores, era preciso ficar oito segundos em cima deles. Uma das mãos do competidor também não podia tocar o animal.
Comprou lá fora o equipamento adequado para montar touros — luva, espora, corda — e voltou ao Brasil para ajudar a começar a implantar a prova conhecida hoje.
Tião Procópio no alto do pódio da Festa do Peão de Barretos em 1981 e a caixa com a TV de 14 polegadas à frente dele
Acervo pessoal
Menos glamour
Em 1980, a Festa do Peão de Barretos promoveu a primeira montaria em touros no estilo americano, e o vencedor foi Paulo Eduardo Schineider, de Fernandópolis (SP). Um ano depois, foi a vez de Tião Procópio brilhar na disputa em um animal de Murilo Tibério, mineiro que também ajudou a popularizar a prova no Brasil.
“O rodeio de cutiano, na época, o prêmio era um carro. E o prêmio do touro foi uma televisão 14 polegadas. Uma diferença muito grande, foi muito difícil o começo, porque tudo tinha que se adaptar, né? Os bretes, a arena, nada era próprio para o rodeio de touro”, conta.
A modalidade foi oficialmente incorporada ao calendário da festa em 1983, quando Marcos Abud Wohnrath, que era membro do clube Os Independentes, assumiu a Diretoria de Rodeio. Só aí o prêmio se equiparou e o touro passou a ter destaque.
Brasil celeiro de campeões
Desde 1994, quando competidores da elite da montaria em touros passaram a disputar o título mundial da modalidade nos EUA, o Brasil esteve 15 vezes no lugar mais alto do pódio.
O país detém a exclusiva marca de ter três tricampeões mundiais: Adriano Moraes, Silvano Alves e José Vitor Leme, o Vitinho. Todos eles passaram pela arena da Festa do Peão de Barretose e acumularam fama e fortuna como peões.
A profissão de peão de rodeio foi equiparada à de atleta por meio de uma lei federal em 2001. Já as normas para a realização dos rodeios foram estabelecidas em 2002, também por força de lei federal.
Tião gosta de explicar a história do rodeio no Brasil comparando-o à ícones do futebol.
“O Garrincha foi como começou a ter a grande divulgação no Brasil em cima do futebol, aqueles dribles dele, coisas de um super atleta. Depois veio o Pelé, e aí o Neymar. No rodeio é tipo assim: no início lá, eu fui o Garrincha, o Garrincha do rodeio; o Adriano Moraes, o Pelé, e o José Vitor Leme e os outros, os Neymar da vida.”
Para a 70ª edição da Festa de Barretos, 3,5 mil competidores estão inscritos em nove modalidades para a disputa de R$ 1,4 milhão.
José Vitor Leme venceu o campeonato nacional da PBR em agosto de 2017 na Festa do Peão de Barretos
Érico Andrade/G1
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