
Legendas se unem para sobreviver e aumentar cacife político, mas acomodação de lideranças regionais e conciliação de estrutura partidária são desafios. Até o fim deste ano, quatro partidos de centro-direita que comandam boa parte do Congresso, dos estados e dos municípios brasileiros passarão por mudanças profundas em suas estruturas.
O União Brasil, criado em 2021 a partir da fusão entre DEM e PSL, vai formar uma federação com o Progressistas (PP).
Evento de anúncio da federação entre União e PP
Renato Araújo/Câmara dos Deputados
O PSDB, que chegou a presidir o país por oito anos e “bateu na trave” outras quatro vezes, vai passar por uma fusão com o Podemos.
Na prática, o efeito é parecido: os partidos, agora funcionando como um só, vão ficar “mais fortes”.
E “mais forte”, para um partido político, pode significar várias coisas, como:
mais dinheiro para campanhas;
mais espaço na divisão de emendas;
maior espaço para relatar projetos e presidir comissões no Congresso; e
maior tempo de TV e rádio nas eleições de 2026.
Apesar disso, o momento político desses quatro partidos não é o mesmo – e entre uma fusão e uma federação, há diferenças importantes.
A “União Progressista” — nome da federação partidária entre PP e União — vai se tornar um gigante partidário. Terá o maior número de deputados, senadores e prefeitos no país, por exemplo.
O “PSDB+Podemos” — nome provisório do futuro partido — tem enfrentado cenários opostos. Enquanto os tucanos minguaram nas últimas eleições e viram seus quadros mais tradicionais migrarem para outras legendas, o Podemos tem registrado crescimento nas eleições federais e municipais.
Executiva nacional do PSDB se reúne para discutir fusão com Podemos
Divulgação/PSDB na Câmara
Mas o desempenho eleitoral está longe de dar segurança às siglas. Isso porque os números estão próximos dos limites necessários para superar a cláusula de barreira e garantir tempo de rádio e TV, e financiamento mensal dos partidos. Na prática, a avaliação é que as siglas estão “se juntando para não desaparecer”.
Entenda em detalhes, nos tópicos abaixo:
para quem servem as federações e fusões;
quais as diferenças entre os dois modelos;
o que levou esses partidos a formarem “duplas”;
como isso mexe com o cenário eleitoral de 2026;
quais são os desafios que as siglas devem enfrentar.
Para quem servem as federações e fusões
Federações e fusões são modelos distintos de aliança partidária. Mas, em resumo, elas servem para que as legendas somem forças e números.
Nos dois casos, o desempenho dos partidos envolvidos nessas alianças são unificados e avaliados, de forma conjunta, para o cálculo da cláusula de barreira — que determina, com base em uma série de regras, quais partidos terão acesso ao fundo partidário e ao tempo de rádio e de TV.
Para as federações e fusões, a distribuição de cadeiras nas câmaras municipais, na Câmara dos Deputados e nas assembleias estaduais levam em conta a soma dos votos dos partidos envolvidos.
Quais as diferenças entre os dois modelos
A federação é um “relacionamento sério” entre dois ou mais partidos. Se estiverem nesse modelo de aliança, as legendas continuam com sua identidade e autonomia, mas, para algumas finalidades, têm de atuar como uma só.
As regras determinam que as siglas que se unirem em uma federação deverão ficar juntas por, no mínimo, quatro anos.
Os membros de uma federação também não podem ter divergências no lançamento de candidaturas. Isso significa que um partido não pode, por exemplo, sair e registrar um candidato sem autorização do outro.
Atualmente, três federações estão registradas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A maior é a formada por PT, PCdoB e PV. As outras duas reúnem PSOL e Rede; e PSDB e Cidadania (que já anunciaram o rompimento).
A fusão é um relacionamento ainda mais sério do que a federação. Nele, os partidos se unem de forma definitiva — deixando de existir separadamente — e dão origem a uma nova legenda.
Além desta diferença, há outras questões relacionadas a repasses de dinheiro público para fusões e para federações.
Nas federações, embora os desempenhos sejam somados para o cálculo da cláusula de barreira, os recursos públicos do fundo partidário — manutenção mensal dos partidos — e do fundo eleitoral — financiamento de campanha — são repassados separadamente para cada sigla que integra uma federação.
Pelas regras, os partidos podem compartilhar recursos para arcar com custos da federação ou para financiar campanhas. Mas cabe exclusivamente a cada legenda definir os critérios de distribuição do dinheiro.
Já nas fusões, por se tratar de uma união definitiva, os recursos são enviados de forma única, para o novo partido.
Valores levam em conta tamanho da bancada; saída de deputados pode afetar montante.
Arte/g1
Outra diferença entre as duas alianças diz respeito à possibilidade de deputados, federais e estaduais, e vereadores de trocarem de partido sem que percam o mandato. Pela legislação, somente a fusão é considerada “justa causa” e autoriza a mudança de legenda.
Desde 1995, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) já autorizou quatro fusões:
1️⃣ Partido Progressista Reformador (PPR) e Partido Progressista (PP) deram origem ao Partido Progressista Brasileiro (PPB). Anos depois, o PPB mudou de nome e virou o Progressistas (PP).
2️⃣ Partido da Reedificação da Ordem Nacional (PRONA) e Partido Liberal (PL) viraram o Partido da República (PR). Anos depois, o PR mudou de nome e virou o Partido Liberal (PL).
3️⃣Partido Social Liberal (PSL) e Democratas (DEM) viraram o União Brasil.
4️⃣Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e Patriota (PATRIOTA) se tornaram o Partido Renovação Democrática (PRD).
Eleição de A a Z: o que é federação partidária
O que levou esses partidos a formarem “duplas”
A fusão ou federação de partidos é uma estratégia, sobretudo, de sobrevivência de legendas “nanicas” ou que foram desidratadas nos últimos anos.
Se unindo, as siglas conseguem superar com mais facilidade a cláusula de barreira e recebem dinheiro do fundo partidário, além de ter acesso ao tempo de TV.
O PSDB sofreu com uma debandada de quadros políticos e teve o pior desempenho da história nas eleições municipais de 2024, o que deve dificultar ainda mais a eleição de deputados federais no ano que vem.
Os tucanos avaliam ainda que a fusão com o Podemos poderá estancar o declínio do PSDB – e garantir que o fator histórico da sigla seja mantido ao longo dos próximos anos.
A “barreira” a ser superada em 2026 pelos partidos é:
conseguir, nas eleições para a Câmara, no mínimo, 2,5% dos votos válidos, distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação, com um mínimo de 1,5% dos votos válidos em cada uma delas; ou
eleger pelo menos 13 deputados federais distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação.
Fusão entre partidos torna mais fácil atingir limites estabelecidos pela cláusula de barreira.
Arte/g1
As federações e fusões também servem para aumentar o capital político e eleitoral de partidos médios, que se tornam figuras centrais nas eleições, como é o caso de União Brasil e PP.
Juntos, os dois partidos terão a maior bancada de deputados na Câmara, o maior número de prefeitos e receberão as maiores fatias de recursos públicos para financiamento de campanhas eleitorais e pagamento de despesas partidárias.
Como isso mexe com o cenário eleitoral de 2026
A concorrência dentro dos partidos pelas candidaturas tende a aumentar já que eles atuarão de forma conjunta nos níveis federal, estadual e municipal.
Com menos partidos em jogo, a lista de candidatos será menor e os partidos precisarão aumentar seu filtro de potenciais puxadores de votos.
A escolha de nomes dentro dos partidos para concorrer às eleições se tornará ainda mais estreita e mais concorrida, e as legendas deverão priorizar nomes que seja,m “puxadores de votos”.
Mais compactada e mais enxuta, as eleições apresentarão “cardápio” reduzido de políticos disponíveis à população.
De saída, União e PP deverão decidir quem apoiarão para a presidência da República em 2026. O União lançou a pré-candidatura de Ronaldo Caiado (GO) e o PP manifestou interesse em colocar o nome da senadora e ex-ministra Tereza Cristina (MS) na disputa.
Caiado se lançou pré-candidato à Presidência pelo União Brasil em evento em Salvador
Malu Vieira / g1 BA
“O presidente Ciro Nogueira (PP) já disse que respeita a pré-candidatura de Ronaldo Caiano, que vai ter todo direito de se movimentar pelo país, de conduzir sua agenda, de tentar se viabilizar, como o Progressistas apresenta o nome da senadora Tereza Cristina. Agora, tudo isso vai ser discutido na hora certa, que é 2026. Até lá, liberdade, apoio e suporte para cada um tocar o seu projeto e crescer”, afirmou o vice-presidente nacional do União, ACM Neto.
Quais são os desafios que as siglas devem enfrentar
Entre os principais desafios dos partidos está a definição das lideranças regionais.
Alguns caciques partidários precisarão abrir mão de candidaturas e de parte do seu poder local para acomodar novas lideranças.
Fusão entre partidos pode embaralhar questões envolvendo lideranças estaduais.
Arte/g1
Um exemplo disso já ficou claro no anúncio da federação União-PP. O ex-presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), era o cotado para presidir a federação, que acabou ficando nas mãos de Antônio Rueda (União) e Ciro Nogueira (PP).
Cotado para presidir a federação União-PP, o ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL) foi preterido.
Mário Agra/Câmara dos Deputados
Até aqui, PP e União definiram o comando de 18 diretórios: 9 ficarão com o PP e outros 9 com o União. O comando dos demais ainda terão de ser definidos pela direção nacional
Além das lideranças regionais e questões de governança interna, os partidos precisarão conciliar os interesses financeiros e de estrutura partidária.
A administração do dinheiro do Fundo Eleitoral, Fundo Partidário e do tempo de televisão terá de contemplar os interesses das siglas.