Arqueólogos na Turquia desenterram pão de 5.000 anos e ajudam a recriar sua receita original


Feito com lentilhas, bulgur e trigo ancestral, o pão de Küllüoba volta à vida em padarias locais.
Uma descoberta que une passado e presente — e inspira ações sustentáveis para o futuro. Os arqueólogos Murat Turkteki (à direita) e Deniz Sari observam uma casa antiga no sítio arqueológico de Kulluoba, na província de Eskisehir, na Turquia central, em 23 de maio de 2025. Um pão de 5.000 anos foi descoberto em setembro de 2024 por arqueólogos na província de Eskisehir, na Turquia central.
Yasin AKGUL / AFP
Nos primórdios da Idade do Bronze, um pedaço de pão foi enterrado sob uma casa recém-construída na atual Turquia. Cinco milênios depois, arqueólogos o desenterraram e ajudaram uma padaria local a recriar a receita.
“Este é o pão assado mais antigo descoberto em uma escavação e preservou em grande parte sua forma”, disse Murat Türkteki, arqueólogo e diretor da escavação de Küllüoba, perto da cidade de Eskisehir, no centro da Turquia.
“Um pão é uma descoberta rara em escavações. Normalmente, só encontramos migalhas. Mas aqui ele foi preservado porque foi queimado e enterrado”, explicou à AFP.
O pão Küllüoba, redondo e achatado como uma hóstia com cerca de 12 centímetros de diâmetro, foi descoberto em setembro de 2024, carbonizado e enterrado por volta de 3.300 a.C.
Um pedaço foi arrancado antes que o pão fosse queimado e enterrado quando a casa foi construída. “Isso nos faz pensar em um ritual de abundância”, disse Türkteki.
O pão Kulluoba, de 5.000 anos, foi descoberto em uma escavação arqueológica na província de Eskisehir, na Turquia central, e exposto no museu arqueológico ETI de Eskisehir, em 23 de maio de 2025.
Yasin AKGUL / AFP
“Empolgados” com a descoberta
Na falta de evidências escritas, o mistério aponta para a civilização anatólia de Küllüoba e seus costumes, como enterrar suas casas antes de se mudar para outro local ou construir novas moradias sobre estruturas mais antigas, formando assim montes.
Na Idade do Bronze, os hatianos, um povo da Anatólia que precedeu os hititas, viviam na região de Eskisehir.
“Küllüoba era uma aglomeração urbana de médio porte com atividades comerciais, artesanais, agrícolas e de mineração. Era evidente a existência de uma certa ordem familiar e social”, explicou o arqueólogo Deniz Sari.
Várias análises mostraram que o pão era feito com sementes de lentilha moídas grosseiramente e farinha de farro, uma variedade antiga de trigo. A folha de uma planta ainda a ser determinada foi usada como fermento.
O pão carbonizado está em exposição no Museu Arqueológico de Eskisehir desde quarta-feira.
“Esta descoberta nos empolgou muito. Enquanto conversava com nosso diretor de escavações, fiquei me perguntando se poderíamos reproduzir este pão”, disse Ayse Ünlüce, prefeita de Eskisehir.
Para seguir o mais fielmente possível a receita original, e já que o trigo farro não existe mais na Turquia, a Prefeitura decidiu, após analisar o pão, usar trigo Kavilca (uma variedade semelhante), bulgur e lentilhas.
Funcionários de uma padaria municipal, que visa fornecer pão de baixo custo em Eskisehir, misturam e cortam a massa para fazer os pães Kulluoba, uma reprodução de um pão de 5.000 anos. Desde 22 de maio, a municipalidade o reproduz usando a receita original e planeja reativar o cultivo do trigo ancestral, mais adaptado à seca.
Yasin AKGUL / AFP
Resistente à seca
Nas instalações da Halk Ekmek (‘Pão do Povo’, em turco), uma padaria local com preços baixos, os funcionários fazem artesanalmente 300 pães de Küllüoba todos os dias desde a semana passada.
“A combinação de farinha de trigo antiga, lentilhas e bulgur produz um pão rico e encorpado, com baixo teor de glúten e sem conservantes”, disse Serap Güler, diretor da Halk Ekmek em Eskisehir.
Os primeiros pães Küllüoba, vendidos em embalagens de 300 gramas por 50 liras turcas (cerca de R$ 7,21), esgotaram em poucas horas.
“Corri porque tinha medo de não sobrar mais nada. Fiquei curiosa para saber qual era o gosto desse pão antigo”, explica a cliente Suzan Kuru.
“Estas terras preservaram este pão por 5.000 anos e nos deram este presente. Temos o dever de proteger esta herança e transmiti-la”, diz Ünlüce.
Os pães Kulluoba cozidos, uma reprodução do pão de 5.000 anos descoberto.
Yasin AKGUL / AFP
A província de Eskisehir, antes rica em recursos hídricos, agora sofre com a seca.
“Estamos enfrentando uma crise climática, mas ainda cultivamos milho e girassol, que exigem muita água. Nossos ancestrais nos ensinaram uma lição. Devemos, como eles, focar em culturas que exijam menos água”, enfatiza a prefeita.
Um dos seus objetivos é reavivar o cultivo do trigo Kavilca na região, que é resistente à seca e às doenças.
“Precisamos de políticas públicas muito fortes para esta questão. Cultivar trigos ancestrais seria um avanço simbólico nesse sentido”, disse.
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