
Os óleos vegetais de semente são saudáveis; na verdade, reduzem o risco cardíaco segundo estudos. Sua demonização é infundada Óleo vegetal de semente é considerado novo vilão da alimentação
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Mais uma vez, aquela distorção típica de “Medo e Delírio em Las Vegas”, obra-prima de Hunter S. Thompson em que as percepções se desfiguram e os exageros devoram a realidade, tenta se infiltrar no imaginário coletivo. Mais uma vez, conteúdos sensacionalistas viralizados em redes prometem fórmulas mágicas para evitar tragédias para a saúde.
Depois de demonizarem o pão, agora são os óleos vegetais de semente que carregam o título de “alimento mais prejudicial”. Acusados de causar estresse oxidativo, inflamação crônica, desequilíbrios hormonais, doenças cardíacas e até câncer, há quem alegue que foram criados originalmente como lubrificantes industriais. Diante dessas afirmações, vale a pena analisar o que a ciência diz — bem longe do barulho das redes.
Ciência X mito: por que óleos de semente são benéficos
Os óleos vegetais de semente, como de girassol, soja e canola, não só são seguros como benéficos quando substituem gorduras menos saudáveis. Trocar gorduras com ácidos graxos saturados (presentes na manteiga, banha e óleo de palma ou coco, por exemplo) por óleos de origem vegetal com ácidos graxos insaturados reduz o risco cardiovascular.
A recomendação se baseia no fato de que esses óleos fornecem ácidos graxos essenciais, como o ácido linoleico (ômega-6) e o ácido alfa-linolênico (ômega-3), que o corpo humano não produz naturalmente. Além disso, seu perfil lipídico, rico em ácidos graxos insaturados, ajuda a reduzir o colesterol LDL (“ruim”). Estudos revelam que quem consome mais gorduras de origem vegetais tem 12% menos risco de AVC do que quem prioriza gorduras de origem animal.
Óleos vegetais: aliados do coração (quando usados direito)
Um dos mitos mais persistentes é que os óleos causam doenças cardíacas; a realidade é que substituir gorduras ricas em ácidos graxos saturados por óleos ricos em ácidos poli-insaturados reduz o risco cardiovascular. Os ômega-6, predominantes em óleos como de girassol, melhoram a saúde vascular ao regular a pressão arterial e reduzir a agregação de plaquetas. Trocar 5% das gorduras saturadas por poli-insaturadas diminui em 24% o risco de eventos coronarianos.
Isso ocorre porque os óleos vegetais de semente podem substituir as gorduras de origem animais (ricas em ácidos graxos saturados), cujo consumo excessivo está ligado ao acúmulo de placas nas artérias. A recomendação é cozinhar com óleos “não tropicais”, como de girassol e canola, em vez de usa banha ou manteiga — prática respaldada por estudos em populações como as de Espanha e Portugal, onde o alto consumo de gorduras insaturadas está associado a menos casos de cardiopatias.
Como os ômega-6 protegem suas artérias
Outro argumento contra os óleos vegetais de semente é seu suposto efeito inflamatório devido ao alto teor de ômega-6. Embora a dieta ocidental moderna tenha uma proporção desbalanceada de ômega-6/ômega-3, não há evidências de que o ômega-6 seja inflamatório por si só. Seu consumo não eleva marcadores inflamatórios como a proteína C reativa.
O segredo está no contexto metabólico: o ácido linoleico (ômega-6) se converte em ácido araquidônico, precursor de moléculas tanto inflamatórias quanto anti-inflamatórias, equilibrando a resposta imune. Reduzir o ômega-6 pode ser contraproducente; sua falta está ligada a maior risco cardiovascular.
A solução é aumentar o consumo de ômega-3, como peixes gordurosos, linhaça e chia, para melhorar a proporção sem descartar fontes saudáveis de ômega-6, tais como nozes, sementes ou abacate. A confusão também surge ao misturar tipos de gordura. As “gorduras saturadas”, ricas em ácidos graxos saturados e sólidas em temperatura ambiente, como a manteiga, elevam o LDL e promovem aterosclerose.
Por essa razão, recomenda-se limitá-las a 10% das calorias diárias. Já as “gorduras trans”, ricas em ácidos graxos trans e hidrogenadas industrialmente, presentes em margarinas e snacks, são ainda piores: aumentam o LDL, reduzem o HDL (“colesterol bom”) e elevam a inflamação sistêmica. Sua proibição na UE e EUA reduziu a mortalidade cardiovascular em 7%. Os óleos vegetais de semente não hidrogenados, por sua vez, não contêm ácidos graxos trans e, em forma líquida, são aliados do coração..
Até o mito de sua origem industrial se desfaz ao entender que, embora alguns óleos vegetais de semente tenham tido usos técnicos como lubrificantes, sua versão alimentícia passa por rigorosos processos de purificação. O óleo de canola, por exemplo, foi desenvolvido a partir do óleo de colza (Brassica napus) para reduzir o ácido erúcico tóxico, e o hexano usado em sua extração industrial é removido com resíduos considerados seguros pela EPA.
Gordura não é tudo igual: o que evitar de verdade
O verdadeiro risco não está nos óleos vegetais de semente em si, mas no contexto da dieta. Sua presença em alimentos ultraprocessados, como batatas fritas industrializadas, salgadinhos e bolos, reflete problemas na qualidade geral do produto, como excesso de sal, açúcar e farinhas refinadas, mas não no óleo como ingrediente isolado.
Os óleos vegetais de semente são reconhecidos como seguros e seu uso moderado na cozinha não só é inofensivo, como facilita a absorção de vitaminas lipossolúveis (A, D, E, K). Mas aquecê-los para frituras em temperaturas extremas ou reutilizá-los repetidamente gera compostos oxidativos como a acroleína, numa lembrança que a técnica culinária importa tanto quanto o ingrediente.
Óleos vegetais: nem mocinhos, nem vilões
Os óleos vegetais de semente não são venenos nem milagres: são ferramentas dietéticas cujo impacto depende de como são integrados à alimentação. Longe de serem “o alimento mais prejudicial”, substituí-los por gorduras de origem animais ou “tropicais” seria um retrocesso na saúde pública, como mostram dados de redução de cardiopatias em populações que os adotaram. A ciência não respalda o alarmismo, mas reforça a necessidade de priorizar gorduras de qualidade, equilibrar ômega-3 e ômega-6, e evitar simplificações. No fim das contas, na nutrição, o vilão raramente está em um único ingrediente, mas no padrão geral que escolhemos para abastecer nossa despensa.
Fabián Patricio Cuenca Mayorga não presta consultoria, trabalha, possui ações ou recebe financiamento de qualquer empresa ou organização que poderia se beneficiar com a publicação deste artigo e não revelou nenhum vínculo relevante além de seu cargo acadêmico.