Justiça dá 72 horas para Prefeitura de São Paulo se explicar sobre afastamento de diretores de 25 escolas


Após uma série de protestos ao longo da última semana, a Secretaria da Educação anunciou, nesta quinta-feira (29), um recuo parcial da medida. Governo de SP também afasta diretores de escolas que tiveram baixo desempenho no Saresp e Saeb
A Justiça de São Paulo deu 72 horas para que a Prefeitura explique quais foram os critérios usados para escolher as 25 escolas cujos diretores foram afastados para participar do programa Juntos pela Aprendizagem.
A ação foi movida pela Bancada Feminista do PSOL, mandato coletivo na Câmara Municipal de São Paulo, e questiona a legalidade da medida, bem como os critérios para a escolha das escolas.
Ao contrário do que afirma a Secretaria Municipal da Educação (SME), apenas 3 das 25 escolas escolhidas têm as piores notas do Ideb 2023 (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) para os anos finais. Outras 8 escolas agora sob intervenção sequer aparecem entre as piores notas.
Divulgado em portaria no último dia 22, o afastamento dos diretores causou comoção na comunidade escolar do município. Após uma série de protestos ao longo da última semana, a SME anunciou, nesta quinta-feira (29), um recuo parcial da medida.
“A ausência de um critério nítido para escolha dos diretores nos leva a crer que a prefeitura está agindo de má-fé para interferir na gestão das escolas visando à privatização, anunciada no início do mandato”, afirma Silvia Ferraro, covereadora da Bancada Feminista do PSOL.
Pedido de esclarecimentos do MP
O Ministério Público de São Paulo (MP-SP) já havia dado um prazo de cinco dias para a Prefeitura de São Paulo explicar o afastamento de 25 diretores de escolas municipais por baixo desempenho no Saresp e no Saeb, esclarecendo:
Quais os fundamentos para os afastamentos;
Qual o período desses afastamentos;
Informar se houve espaço para defesa dos diretores afastados;
Como se dará a substituição desses profissionais.
O pedido de esclarecimentos da promotora Fernanda Peixoto Cassiano, de 23 de maio, foi encaminhado ao MP pelo vereador Celso Giannazi (PSOL), pelo deputado estadual Carlos Giannazi (PSOL) e pela deputada federal Luciene Cavalcante (PSOL), que contestam o afastamento compulsório seguido de um curso de formação de 1.770 horas.
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Segundo a gestão municipal informou na data do afastamento, dia 23, a medida faz parte de um plano de “requalificação intensiva”, previsto no Programa Juntos pela Aprendizagem, instituído em 25 de abril — em meio à greve de professores. Portanto, o afastamento seria algo temporário, sem impactos à remuneração e ao posto ocupado pelos profissionais (leia mais abaixo).
Contudo, os críticos veem a ação como uma “intervenção autoritária” do governo no sistema educacional, uma vez que os conselhos escolares não foram consultados e não houve diálogo com a comunidade escolar.
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O secretário municipal de Educação da gestão Nunes, Fernando Padula, em foto na EMEF Perimetral, em Paraisópolis, em 20-04-2023. Foto:
Rovena Rosa/Agência Brasil
Secretaria estadual
Nos últimos meses, a Secretaria Estadual da Educação de São Paulo (Seduc-SP) afastou pelo menos seis diretores efetivos de escolas públicas estaduais onde os estudantes tiveram baixo desempenho em avaliações públicas.
Governo de SP também afasta diretores de escolas que tiveram baixo desempenho no Saresp e Saeb
Segundo a Seduc-SP, os diretores retirados dos cargos manterão os salários, mas passarão por processo de requalificação.
A secretaria estadual comandada por Renato Feder diz que os afastamentos estão regulamentados por uma resolução da pasta de janeiro de 2024, que estabeleceu critérios de desempenho dos alunos.
A avaliação considera indicadores como frequência dos estudantes, participação nas provas bimestrais e o desempenho no Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (Saresp) ou no Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB).
O uso das plataformas digitais também é analisado, mas com peso menor na composição final.
O desempenho também considera o grau de vulnerabilidade de cada unidade escolar, para garantir equidade entre as escolas avaliadas, segundo a secretaria.
“A pasta ressalta que a permanência de profissionais designados para a função de diretor sempre esteve sujeita à avaliação pelas respectivas Diretorias de Ensino. Nesses casos, a resolução pode ser utilizada como base para a decisão, mas não é fator obrigatório. Os profissionais continuam atuando na rede estadual em outras atividades”, disse (veja íntegra abaixo).
O secretário estadual de Educação, Renado Feder, e o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos).
Ciete Silvério/EducaçãoSP
Surpresa dos professores
Apesar das justificativas da secretaria, alguns diretores afastados disseram ao telejornal SP1, da TV Globo, que foram pegos de surpresa pela decisão da Seduc-SP.
“Cheguei de manhã para trabalhar, como todos os dias, não tinha o conhecimento de uma publicação no Diário Oficial. Fui surpreendida por um supervisor que já estava acompanhado por um outro colega, que iria já fazer esse papel de diretor. Soube que a partir daquele momento eu não fazia mais parte do grupo de diretores da Diretoria de Ensino”, disse uma diretora que não quis se identificar, por medo de mais represálias.
Ela afirmou que a sala de aula na rede estadual está cada vez mais distante da aprendizagem real dos alunos e, por isso, as escolas da rede têm registrado desempenho tão baixo.
Diretora fala ao SP1 sobre o afastamento da escola, promovida pela Secretaria Estadual da Educação (Seduc-SP).
Reprodução/TV Globo
A diretora afirmou que o aprendizado por plataformas, iniciado na gestão do ex-governador João Doria (Sem partido) durante a pandemia – e intensificado na gestão Tarcísio -, está no centro dos problemas de aprendizado nas escolas estaduais paulistas.
“O ambiente escolar era um ambiente alegre, feliz, com projetos pedagógicos sendo realizados. Muitos projetos interdisciplinares. Hoje é um ambiente que só faz plataforma, plataforma, plataforma. São realizadas atividades online de diversas disciplinas”, declarou.
Os professores e diretores disseram ao SP1 que falta estrutura nas escolas estaduais até para que os estudantes acessem essas plataformas digitais do governo paulista.
“A gente acaba sendo ‘babá’ de plataforma. Eu tenho que exigir que meu aluno faça, eu tenho que dar condição pra ele fazer e eu não consigo dar minha aula mais. Como é a resposta dos alunos ao preenchimento dessas plataformas, que são a base da avaliação?”, declarou uma professora, também na condição de anonimato.
“Geralmente, se a gente cobra muito, eles fazem. E fazem de forma mecânica. Sem ler, sem entender, sem tirar dúvida. Eles entendem que é só pra entrar lá e responder. Responder qualquer coisa, se tá certo ou errado, pra eles não importa”, completou a professora.
Professora fala ao SP1 sobre situação das escolas estaduais, geridas pela Secretaria Estadual da Educação (Seduc-SP).
Reprodução/TV Globo
O Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp) questiona os critérios da avaliação e diz que ela exclui a comunidade educacional.
“A avaliação hoje que daria conta da qualidade da educação e da verificação se os profissionais estão dando conta dessa qualidade é uma avaliação coletiva, que deve ser pelo conselho de escola. Lá você tem professores, pares, pais, estudantes, funcionários”, disse Roberto Guido, diretor da Apeoesp.
O professor da Faculdade de Educação da USP Fernando Cássio diz que há outras formas de avaliar o desempenho dos alunos, para além do afastamento do corpo diretivo das escolas.
“A qualidade da educação é muito mais complexa. Tem muitas coisas que interferem nela, inclusive a infraestrutura das escolas, inclusive a condição de trabalho dos profissionais da educação que lá atuam, inclusive a existência de políticas intersectoriais para reforçar o trabalho da educação, inclusive a existência de gestão democrática de processos participativos na escola”, disse.
“Então os indicadores, eles realmente não são sinônimo da qualidade da educação. Falta muita justificativa pedagógica para depositar a confiança toda nesses indicadores. É preciso que as secretarias de educação compreendam a qualidade da educação como um fenômeno complexo, porque senão a gente não vai avançar nunca nisso”, completou.
Aluno da rede estadual de educação faz lição em plataforma do governo de São Paulo.
Divulgação/Seduc-SP
Nota da Seduc-SP
“A Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (Seduc-SP) informa que seis diretores efetivos foram afastados desde o ano passado com base nos critérios estabelecidos pela Resolução nº 12, de 23 de janeiro de 2025 (que altera a Resolução SEDUC nº 4, de 19 de janeiro de 2024) . A normativa regulamenta o processo de avaliação de desempenho dos diretores da rede estadual, conforme previsto desde 2022, pela Lei 1.374, de 30 de março.
A pasta ressalta que a permanência de profissionais designados para a função de diretor sempre esteve sujeita à avaliação pelas respectivas Diretorias de Ensino. Nesses casos, a resolução pode ser utilizada como base para a decisão, mas não é fator obrigatório.
A avaliação considera indicadores como frequência dos estudantes, participação nas provas bimestrais e o desempenho no Saresp ou no SAEB. O uso das plataformas digitais também é analisado, mas com peso menor na composição final. O desempenho também considera o grau de vulnerabilidade de cada unidade escolar, para garantir equidade entre as escolas avaliadas. Os profissionais continuam atuando na rede estadual em outras atividades”.
Afastamentos na rede municipal
No caso da Secretaria municipal da Educação, os diretores foram convocados para participar de um programa de requalificação, que vai durar até o fim do ano letivo. Eles foram comunicados da medida na quinta.
Ainda de acordo com a pasta gerida por Fernando Padula, as escolas vão contar com o reforço de mais um profissional na parte gestora da escola. A remuneração dos diretores será mantida.
Os diretores atuam há pelo menos quatro anos nessas unidades e foram afastados em razão do rendimento obtido nas provas de 2023 do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) e do Idep (Índice de Desenvolvimento da Educação Paulistana).
O prefeito Ricardo Nunes (MDB) ao lado do secretário de educação, Fernando Padula
Divulgação/PMSP
O que diz a gestão Ricardo Nunes
Leia a íntegra da nota da Prefeitura de SP:
“A Secretaria Municipal de Educação (SME) informa que 25 diretores de escolas municipais em tempo integral serão convocados para participar, entre maio e dezembro, de uma requalificação intensiva do Programa Juntos pela Aprendizagem.
Esses profissionais atuam há, pelo menos, 4 anos em unidades prioritárias, selecionadas devido ao desempenho obtido no Ideb e Idep de 2023.
A capacitação, inédita, inclui vivência em outras unidades educacionais e tem como objetivo o aprimoramento da gestão pedagógica para melhorar a aprendizagem de todos os estudantes.
As unidades contarão com o reforço de mais um profissional na equipe gestora. A remuneração dos diretores será mantida”.
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