
Rede Escola Pública e Universidade verificou que a Secretaria Municipal da Educação utilizou uma mescla aleatória de indicadores para tomar decisão sobre as escolas. Algumas foram avaliadas pelo seu desempenho no Ideb, outras no Idep. Sala de aula de escola na Zona Leste de SP
Renata Bitar/g1SP
Pesquisadores da Rede Escola Pública e Universidade (Repu) afirmam que o afastamento dos 25 diretores da rede municipal de ensino pela Prefeitura de São Paulo no final de maio foi arbitrário e sem critérios objetivos.
O grupo realizou uma análise técnica dos critérios adotados pela gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) e divulgou uma nota nesta segunda-feira (2).
A Repu é composta por professores e pesquisadores de universidades públicas (UFABC, UFSCar, Unicamp, Unifesp e USP), do Instituto Federal de São Paulo e da rede estadual de São Paulo.
➡️ Segundo a Secretaria Municipal da Educação, os diretores afastados atuam há pelo menos quatro anos nas escolas e foram afastados em razão do baixo desempenho dos alunos nas provas de 2023 do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) e do Idep (Índice de Desenvolvimento da Educação Paulistana).
Contudo, os pesquisadores verificaram que a secretaria utilizou uma mescla aleatória de indicadores para tomar decisão sobre as escolas: algumas foram avaliadas pelo seu desempenho no Ideb, outras, no Idep; algumas pelo desempenho nos anos Anos Iniciais, outras, nos Anos Finais.
Os índices têm critérios diferentes. O Ideb é calculado com base no desempenho dos estudantes em provas padronizadas de português e matemática, aplicadas a cada dois anos. Enquanto o Idep pode levar em conta outras disciplinas (ciências naturais, humanas e produção de texto), a depender da série analisada.
Portanto, a pesquisa concluiu que foi adotado um procedimento tecnicamente inconsistente.
Leonardo Crochik, professor do Instituto Federal de São Paulo e um dos autores da Nota Técnica, pontua que “fazer um uso sistemático dos indicadores para uma ação como essa já seria altamente questionável. Mas quando se descobre que a Prefeitura de São Paulo, ainda por cima, pinçou índices aleatórios para justificar a intervenção em cada escola, a situação torna-se muito pior: o que vemos é uma ação arbitrária e incompatível com princípios elementares da gestão pública”.
Procurada, a Secretaria Municipal da Educação informou que “a seleção das 25 unidades escolares prioritárias seguiu critérios técnicos e transparentes, que levaram em consideração preferencialmente os indicadores do Ideb 2023. No caso das escolas que não tiveram esse índice divulgado, devido à participação inferior a 80% dos estudantes nas provas aplicadas, foi utilizado o Idep 2023” (confira a íntegra mais abaixo).
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Desempenho não justifica intervenção
A análise da Repu revela que nenhuma das 25 escolas que tiveram seus diretores afastados ocupa as últimas posições da rede municipal nos indicadores citados. Pelo contrário: parte dessas unidades apresentou desempenho acima da média da cidade tanto no Ideb quanto no Idep.
Portanto, a depender da escolha do índice utilizado, uma escola poderia estar posicionada tanto em situação de desvantagem quanto de vantagem em relação às demais escolas da rede municipal.
Em um dos casos, a escola está entre as 11 melhores do município no cumprimento das metas do Ideb 2023 para os Anos Finais do Ensino Fundamental — sendo uma das poucas a alcançar o resultado esperado.
“O uso de indicadores de avaliações de larga escala para intervir em escolas e responsabilizar gestores individualmente não tem fundamento estatístico e desconsidera os diferentes contextos de trabalho nas escolas”, adverte Fernando Cássio, professor da Faculdade de Educação da USP.
Os pesquisadores afirmam que “indicadores educacionais oferecem informações limitadas sobre a qualidade da educação pública, e jamais deveriam ser utilizados com finalidades de premiação ou punição de educadores”.
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O que diz a secretaria
“A Secretaria Municipal de Educação (SME) reafirma que a seleção das 25 unidades escolares prioritárias seguiu critérios técnicos e transparentes, que levaram em consideração preferencialmente os indicadores do Ideb 2023. No caso das escolas que não tiveram esse índice divulgado, devido à participação inferior a 80% dos estudantes nas provas aplicadas, foi utilizado o Idep 2023. Outro critério para a definição das unidades foi o tempo de atuação de, pelo menos, quatro anos dos diretores no cargo. Importante destacar que o processo se baseou nos resultados dos anos iniciais e finais do Ensino Fundamental obtidos por cada escola. Das 25 unidades educacionais selecionadas, 16 foram escolhidas com base nos índices dos anos iniciais, sendo 11 pelo Ideb e 5 pelo Idep 2023; 9 escolas foram selecionadas com base nos índices dos anos finais, sendo 1 pelo Ideb e 8 pelo Idep 2023.
Ressalta-se, ainda, que todas as 25 escolas não atingiram as metas estabelecidas pelo Ideb nas duas últimas edições. Em 2023, foi considerada a meta projetada para 2021, conforme decisão do MEC/INEP, em razão dos impactos provocados pela pandemia.
Na lista abaixo, entre parênteses, seguem os critérios para a seleção das escolas:
CEU EMEF Professor Antonio Carlos Rocha (IDEB AI até 4,9; não atingiu sua meta projetada em 2023)
EMEF Professor Aroldo de Azevedo (não teve Ideb AF 2023 divulgado; sem alcance da meta projetada, Idep abaixo de 3.3)
EMEF Almirante Ary Parreiras (IDEB AI até 4,9; não atingiu sua meta projetada em 2023)
EMEF Deputado Caio Sérgio Pompeu de Toledo (não teve o Ideb AF divulgado em duas edições e com Idep Até 3.3)
CEU EMEF Campos Salles (IDEB AI até 4,9; não atingiu sua meta projetada em 2023)
EMEF Cecília Moraes de Vasconcelos (não teve o Ideb AI divulgado; Idep abaixo 3,7)
EMEF Professora Daisy Amadio Fujiwara (Não teve o IDEB AF divulgado em duas edições e com IDEP até 3,3)
EMEF Dilermando Dias dos Santos (IDEB AI até 4,9; não atingiu sua meta projetada em 2023)
EMEF Professora Eda Terezinha Chica Medeiros (IDEB AI até 4,9; não atingiu sua meta projetada em 2023)
EMEF Espaço de Bitita (IDEB AI até 4,9; não atingiu sua meta projetada em 2023)
EMEF Professor Flávio Augusto Rosa (não teve o Ideb AF divulgado em duas edições e com Idep até 3.3)
EMEF Geraldo Sesso Junior (não teve o Ideb AI divulgado; teve Idep abaixo 3,7)
EMEF Ibrahim Nobre (não teve o Ideb AI divulgado; Idep abaixo 3,7)
EMEF João XXIII (não teve o Ideb AF divulgado em duas edições e com Idep Até 3.3)
EMEF Mário Lago (Ideb AF até 4,3; não atingiu sua meta projetada em 2023)
EMEF Mururés (Ideb AI até 4,9; não atingiu sua meta projetada em 2023)
EMEF Professora Olinda Menezes Serra Vidal (IDEB AI até 4,9; não atingiu sua meta projetada em 2023)
CEU EMEF Paraisópolis (não teve o Ideb AF divulgado em duas edições e com Idep até 3.3 )
EMEF Pedro Américo (não teve o Ideb AF divulgado em 2023 e com Idep até 3.3)
EMEF Pedro Teixeira (IDEB AF até 4,3; não atingiu sua meta projetada em 2023)
EMEF Perimetral (Ideb AI até 4,9; não atingiu sua meta projetada em 2023)
EMEF Plínio Marcos (não teve o Ideb AI divulgado; Idep abaixo 3,7)
EMEF Saturnino Pereira (IDEB AI até 4,9; não atingiu sua meta projetada em 2023)
EMEF Sud Mennucci (IDEB AI até 4,9; não atingiu sua meta projetada em 2023)
EMEF Vinicius de Moraes (IDEB AF até 4,3; não atingiu sua meta projetada em 2023).”