
O julgamento tinha sido suspenso em dezembro de 2024, quando o ministro André Mendonça pediu vista – mais tempo para analisar o tema. STF retoma julgamento sobre responsabilidade das redes sociais pelo conteúdo publicado
O STF – Supremo Tribunal Federal retomou nesta quarta-feira (4) o julgamento sobre a responsabilidade das plataformas digitais por conteúdos falsos e criminosos publicados nas redes sociais.
O julgamento tinha sido suspenso em dezembro de 2024, quando o ministro André Mendonça pediu vista – mais tempo para analisar o tema. Até aquele momento, três ministros já haviam votado no julgamento de dois recursos que questionam a validade do artigo 19 do Marco Civil da Internet.
A lei de 2014 estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil. O trecho da lei questionado diz que redes sociais e plataformas digitais somente serão responsabilizadas por conteúdo de terceiros se não removerem a postagem após ordem judicial.
Os relatores das ações, Dias Toffoli e Luiz Fux, consideraram todo o artigo 19 inconstitucional. Já o ministro Luís Roberto Barroso defendeu a inconstitucionalidade parcial do artigo.
Em seu voto, em dezembro, o ministro Toffoli votou para que as empresas sejam responsabilizadas por postagens ofensivas e ilícitas de seus usuários, caso deixem de agir a partir do momento em que forem notificadas pela vítima ou advogado – sem a necessidade de uma ordem judicial. Toffoli deu exemplos do que pode ser considerado conteúdo ofensivo ou ilícito:
postagens contra o Estado Democrático de Direito;
terrorismo, instigação ou auxílio a suicídio ou à automutilação;
racismo;
violência contra criança, adolescente, mulheres e pessoas vulneráveis;
e divulgação de fake news que levem à incitação de outros crimes ou com potencial para causar danos a processos eleitorais.
STF retoma julgamento sobre responsabilidade das redes sociais pelo conteúdo publicado
Jornal Nacional/ Reprodução
O ministro também estabeleceu situações em que as plataformas devem ser responsabilizadas judicialmente pelo conteúdo de terceiros, mesmo que não tenham sido notificadas:
quando recomendarem ou impulsionarem conteúdos criminosos, incluindo anúncios falsos criados para dar golpes nos usuários;
e se os conteúdos forem publicados por perfis falsos ou automatizados.
Fux seguiu o posicionamento de Toffoli e defendeu que a remoção de conteúdos considerados ofensivos ou irregulares deve ser imediata, assim que a vítima notificar a plataforma.
O ministro Luís Roberto Barroso divergiu ao considerar que, no caso de crimes contra a honra – como injúria, calúnia e difamação -, o conteúdo só deve ser removido pelas plataformas quando houver decisão judicial. Já nos casos de crimes em geral, com danos individuais, Barroso concordou com Toffoli e Fux: as plataformas devem retirar as postagens a partir do momento em que forem notificadas pela vítima, sem a necessidade de entrar na Justiça.
Nesta quarta-feira (4), na reabertura do julgamento, Barroso afirmou que o papel do STF é decidir sobre as questões que chegam à Corte e que, ao tratar do tema, o STF – Supremo Tribunal Federal não está invadindo a competência do Legislativo, nem desrespeitando o princípio da separação de Poderes. O ministro também enfatizou que discutir sobre a responsabilização das mídias digitais e a remoção de conteúdo criminoso não representa censura.
“Os critérios adotados pelo tribunal para decidir os casos trazidos perante ele só prevalecerão até que o Congresso Nacional legisle, se e quando entender que deve legislar a respeito. E quando o Congresso legislar a respeito, é a vontade do Congresso que vai ser aplicada pelo STF – Supremo Tribunal Federal, desde que, evidentemente, compatível com a Constituição. Estabelecer os critérios que vão reger os casos que chegarem ao Judiciário é nosso dever e nada tem de invasão à competência dos outros Poderes e muito menos tem a ver com censura. Nós estamos discutindo responsabilidade civil. Nós vamos decidir se as pessoas que ajuizaram as ações têm ou não têm direito a uma indenização”, disse o ministro Luís Roberto Barroso.
Toffoli disse que o que está em discussão é o momento em que as plataformas são responsabilizadas:
“Da forma como hoje está o artigo 19, essa responsabilidade só existe e surge se e quando descumprida a decisão judicial. Se cumprida a decisão judicial, eu não tenho que pagar nada. É disso que se trata o artigo 19. Então, não se trata de censura, não se trata de liberdade de expressão, porque ninguém diz que a irresponsabilidade é possível. Não estamos aqui tratando de censura de maneira nenhuma, não estamos tratando de tolher a liberdade de expressão. O que nós estamos aqui a tratar é o momento em que surge a responsabilização”, disse o ministro Dias Toffoli.
STF retoma julgamento sobre responsabilidade das redes sociais pelo conteúdo publicado
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Em seguida, o ministro André Mendonça começou a votar. Mendonça avisou que seria um voto longo, que deve se estender até o fim da sessão desta quinta-feira (5). O ministro disse que o tema exige uma análise minuciosa, que deve considerar a liberdade de expressão e a proteção de direitos fundamentais. Mendonça disse que, com o surgimento das redes sociais, os usuários de internet não são apenas consumidores, mas também produtores de conteúdo. Isso, segundo o ministro, faz com que as publicações não tenham filtros profissionais ou editoriais, o que gera desafios para as instituições:
“Nessa conjuntura, é preciso tomar cuidado redobrado com a inibição, por meio de uma excessiva intervenção sobre o indivíduo — seja por meio direto do Estado, seja por meio de organizações particulares —, quanto a sua livre manifestação em arenas digitais”.
O ministro disse que cabe ao Congresso e não ao Supremo, a discussão sobre as responsabilidades das redes sociais pelas postagens de seus usuários:
“Por tudo o quanto visto até aqui, pode-se concluir com certa facilidade que, dentro de uma lógica de separação de poderes como distribuição alocativa das funções estatais, o Congresso Nacional é a instituição que detém a maior capacidade institucional para captar, tratar e elaborar arranjo normativo afim de externar os anseios da sociedade em relação ao tema”.
Nesta quinta-feira (5), o julgamento sobre a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet continua no STF com a finalização do voto do ministro André Mendonça. Depois dele, outros sete ministros ainda precisam votar. O presidente do Supremo, Luís Roberto Barroso, disse que o julgamento pode continuar na semana que vem.
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