Minoria na profissão, engenheiras falam sobre dificuldades e preconceitos na área: ‘Competência não tem gênero’


Fernanda Ferreira Cirqueira é engenheira civil e Giovanna Souza Pereira dos Santos, engenheira agrônoma de Sorocaba (SP). Segundo pesquisa feita pelo Conselho Federal de Engenharia e Agronomia, com mais de um milhão de profissionais ativos registrados no país, apenas 19,54% são mulheres. Fernanda Ferreira Cirqueira, engenheira civil, e Giovanna Souza Pereira dos Santos, engenheira agrônoma de Sorocaba (SP)
Arquivo pessoal
Seja civil, elétrica, química, mecânica ou agronômica, de softwares ou de alimentos, as engenharias existem com uma finalidade em comum: melhorar a vida humana e da sociedade. Para isso, é preciso aplicar com precisão conhecimentos matemáticos, científicos e de cunho técnico para resolver problemas e elaborar projetos. Com mais de um milhão de engenheiros registrados no Brasil, menos de 20% são mulheres, segundo o Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea).
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No Dia Internacional das Mulheres na Engenharia, celebrado nesta segunda-feira (23), o g1 conversou com duas especialistas em áreas distintas para entender os desafios de ser uma mulher engenheira e como a profissão exige, além da competência, a força para lidar com o machismos e preconceitos.
Conforme dados do Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea), existem mais de um milhão de profissionais ativos registrados no país, porém, deste número, apenas 19,54% representam as mulheres. A pesquisa também mostra que a média de idade das engenheiras no Brasil é de 38 anos, sendo que 36% delas estão registradas há menos de cinco anos.
Com base no Confea, a procura mais jovem por esta carreira tem aumentado, o que pode ser uma consequência da visibilidade e empoderamento que a profissão tem ganhado no decorrer dos anos.
Cada vez mais mulheres procuram seguir a engenharia e desafiar estereótipos que, inclusive, nem deveriam existir, afinal, “competência não tem gênero”. A dona desta frase é Fernanda Ferreira Cirqueira, de 47 anos. Ela é engenheira civil de Sorocaba e pós-graduada em Engenharia de Segurança do Trabalho, Estruturas de Concreto Armado e especializações em Perícias e Avaliações Técnicas.
Fernanda também atua na fiscalização e gerenciamento de obras, regularização de imóveis junto ao Corpo de Bombeiros e à prefeitura, além de fazer perícias, avaliações técnicas e ser a diretora secretária da Associação dos Engenheiros e Arquitetos de Sorocaba (AEAS), onde, segundo ela, contribui com o fortalecimento da classe.
Fernanda Ferreira Cirqueira é engenheira civil de Sorocaba (SP) e diretora da AEAS
Arquivo pessoal
🔧 ‘Mostrar que a gente sabe o que faz’
Em entrevista ao g1, Fernanda contou que já presenciou diversos episódios machistas no início da carreira, que continuam acontecendo até os dias atuais. O que mudou foi a forma como ela lida com eles.
“No começo chorei muito, sempre escondido, porque ninguém precisa ver nossas lágrimas, mas isso só me fortaleceu para não desistir. Com o tempo, aprendi a colocar eles (homens) no lugar deles, mostrar meu valor e exigir respeito. No final das contas, quem insiste em me desmerecer acaba virando fã do meu trabalho e da minha força. A melhor resposta é mostrar que a gente sabe o que faz e faz com excelência, sem deixar espaço para dúvidas”, pontuou.
De acordo com Fernanda, seu trabalho na AEAS também serve de apoio às mulheres, estudantes e profissionais em desenvolvimento, pois oferece mentorias, orientações, vivências práticas e incentivo para que descubram seus talentos e conquistem seu espaço na engenharia.
Inicialmente, Fernanda tentou seguir carreira em Radiologia Médica. Inclusive, cursou medicina por um ano na Argentina, mas depois que engravidou, voltou ao Brasil para se dedicar à família. Essa mudança que acabou a frustrando, pois não conseguiu dar continuidade aos estudos, uma vez que estudar medicina no Brasil era muito mais caro.
“Dessa frustração, nasceu um novo caminho: escolhi a Engenharia Civil. Eu, que nem gostava de matemática na escola, descobri na faculdade que tinha talento, comecei a tirar boas notas e me apaixonei pela profissão. Vim de escola pública, com pouca cobrança e acredito que minha história mostra que, às vezes, é preciso se perder um pouco para se encontrar. A engenharia me reconectou comigo mesma e hoje sou muito feliz com minha escolha”, destacou.
Fernanda Ferreira Cirqueira, de Sorocaba (SP), se inspira em outras mulheres na engenharia
Arquivo pessoal
Fernanda ainda enfatizou que existem muitas mulheres importantes na engenharia que a inspiram todos os dias. Para a profissional, outras mulheres engenheiras mostram que a profissão é para todos, e que as mulheres têm espaço, força e competência para ocupar cargos de destaque.
“Ver outras profissionais e alunas crescendo e se descobrindo na engenharia é uma das maiores recompensas da minha jornada”, diz.
“Tenho muito orgulho. Ser mulher e engenheira é um desafio constante, mas também uma conquista diária. A gente prova que competência não tem gênero e que podemos liderar obras, equipes e decisões com firmeza, técnica e sensibilidade. Ser engenheira me permite transformar espaços e também realidades e isso me realiza como profissional e como mulher”, finaliza.
Engenheira civil, Fernanda Ferreira Cirqueira, também faz mentorias sobre engenharia em Sorocaba (SP)
Arquivo pessoal
🚜 Engenheira agrônoma 🌾
Uma das associadas da Associação dos Engenheiros e Arquitetos de Sorocaba (AEAS) é a jovem Giovanna Souza Pereira dos Santos, de 24 anos. Ela é engenheira agrônoma e também tem muito orgulho da sua escolha profissional.
“Desde cedo, sempre gostei de ciências, tecnologia e robótica. Fiz um curso técnico em Automação Industrial, mas, no final do curso, comecei a me interessar por outras áreas, principalmente biologia e sustentabilidade. Foi numa feira de tecnologia que me apresentaram a engenharia agronômica. Fui pesquisar por conta própria e me encantei com o potencial da profissão e as possibilidades que ela oferece como atuar em pesquisa, inovação e temas com impacto real. Me identifiquei com tudo isso e decidi seguir esse caminho”, explicou.
Giovanna Souza Pereira dos Santos é uma engenheira agrônoma de Sorocaba (SP)
Arquivo pessoal
A área de atuação de Giovanna é muito ampla, segundo ela, pois envolve o manejo do solo, da água, plantas, o controle fitossanitário, que preserva vegetais, além da gestão da produção agrícola e do desenvolvimento de tecnologias para o campo.
O engenheiro agrônomo atua em áreas de pesquisa, consultoria, agroindústria e também de sustentabilidade. Na região de Sorocaba, a jovem já participou de uma iniciação científica com foco em fibras naturais, entrevistou produtores rurais e se envolveu com projetos voltados à sustentabilidade, inclusive no Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Sorocaba (Crea).
“Conheci outras mulheres que atuam na área e servem de inspiração, principalmente algumas que conheci na sede do Crea que, mesmo sem me conhecerem direito, me apoiaram e incentivaram bastante em um momento delicado para mim. Mas a minha maior inspiração é a Doutora Thaís Guarda Prado Avancini, engenheira agrônoma com mestrado e doutorado na área de solos. Além disso, tem um jeito muito genuíno, simpático e um senso de humor único, o que torna o trabalho dela ainda mais inspirador para mim”, lembrou Giovanna.
Jovem Giovanna Souza Pereira dos Santos é de Sorocaba (SP) e faz parte da AEAS
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Giovanna conta que também presenciou situações machistas durante seu estágio e período de graduação na área de engenharia. Em visitas a fazendas e cooperativas, a jovem relata que sentiu olhares desconfiados e ouviu comentários que não eram agradáveis sobre seu trabalho, mas segundo ela, se mantive firme, sempre mostrando segurança.
As professoras da engenheira também compartilhavam muitas histórias de machismo que sofreram na carreira durante as aulas. Apesar de serem situações difíceis, para a jovem, é justamente por isso que é tão importante ter uma rede de apoio composta por outras mulheres com quem podem trocar experiências e fortalecer a confiança.
“A agronomia é uma área cheia de possibilidades e, apesar de ainda enfrentarmos alguns preconceitos, é muito gratificante ver cada pequena conquista, cada espaço que ocupamos. Ser mulher nessa área ou em qualquer outra engenharia é complicado, você precisa aprender a se posicionar, comunicar com precisão, a não se calar e a seguir firme, mesmo quando o ambiente não é tão acolhedor. Mas também é muito bom encontrar outras mulheres pelo caminho que te inspiram, te ajudam e te lembram que você não está sozinha”, finalizou a jovem.
Engenheira agrônoma de Sorocaba (SP) fala sobre como lidar com situação machistas na profissão
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