Processo aponta denúncias de romance com preso, corrupção e envolvimento com facções contra ex-diretora de presídio na Bahia


Joneuma Silva Neres, de 33 anos, foi indiciada por facilitar a fuga de 16 presos da unidade, na cidade de Eunápolis, no extremo sul do estado, em dezembro do ano passado. Ela tinha nove meses no cargo. Ex-diretora de presídio é presa suspeita de facilitar fuga de 16 detentos na Bahia
Arquivo Pessoal
Além de ter sido indiciada por facilitar a fuga dos 16 presos do Conjunto Penal de Eunápolis, no extremo sul da Bahia, a ex-diretora da unidade é acusada de corrupção, envolvimento com facções criminosas e, ainda, de ter se relacionado com um interno do presídio.
As informações estão no processo do caso, ao qual a TV Bahia teve acesso com exclusividade e detalhou nesta quinta-feira (3), quase sete meses após a fuga em massa. Quinze fugitivos ainda são procurados.
Além de Joneuma Silva Neres, de 33 anos, outras 17 pessoas foram indiciadas pelo Ministério Público do estado (MP-BA). Entre elas, Wellington Oliveira Sousa, o ex-coordenador de segurança do presídio, cargo de confiança da ex-diretora. Os dois estão presos.
Joneuma esteve à frente a unidade por nove meses e foi a primeira mulher a ocupar este tipo de cargo no estado. No entanto, apesar da representatividade, o que veio à tona após as prisões revela que o conjunto penal estava sob comando do crime organizado.
O processo mostra que, desde que assumiu o cargo, em março de 2024, a gestão da então diretora foi chamando a atenção das autoridades, muito pelas regalias dadas aos presos. Segundo informações do processo, ela autorizou a entrada irregular de roupas, freezers, ventiladores e sanduicheiras.
O ex-coordenador de segurança da unidade foi uma das pessoas que revelaram as irregularidades. Em um dos depoimentos, Wellington contou que Joneuma atendia a diversas exigências feitas, principalmente, por Ednaldo Pereira de Souza, mais conhecido como Dadá.
Ednaldo é apontado pela polícia como chefe de uma facção de Eunápolis, que é ligada a outro grupo criminoso do Rio de Janeiro (RJ). Ele estava preso na unidade penal até o dia 12 de dezembro, quando aconteceu a fuga em massa.
Entre as regalias apontadas no depoimento, está que a esposa de Ednaldo “passou a ingressar no conjunto penal, sem qualquer inspeção, mediante autorização da diretora”.
Outros relatos indicaram ainda que Joneuma e Ednaldo também viveram um relacionamento amoroso paralelo, com relações sexuais, dentro do presídio.
Em depoimento, o ex-coordenador de segurança não cita a existência de um relacionamento amoroso, mas menciona que eles tinham “encontros frequentes, que ocorriam na sala de videoconferências, sempre a sós, com uma folha de papel ofício obstruindo a visibilidade da porta pela abertura de vidro”.
O homem disse também que “as reuniões eram sigilosas e geravam estranheza entre os funcionários devido a regularidade e longa duração”.
Quando foi presa, no dia 24 de janeiro deste ano, Joneuma estava grávida. O bebê nasceu prematuro e segue com ela na cela, no Conjunto Penal de Itabuna, na mesma região do estado.
Em entrevista à TV Bahia, Jocelma Neres, irmã e advogada de Joneuma, nega a existência de um caso entre ela e Dadá.
A advogada relata preocupação também com o fato do sobrinho seguir no presídio com a mãe.
Já o advogado criminal de Joneuma, Artur Nunes, explicou porque alguns benefícios eram concedidos aos detentos.
Paternidade contestada
Em abril deste ano, Joneuma Silva Neres protocolou um pedido judicial de auxílio financeiro para cobrir gastos com a gravidez contra o ex-deputado federal Uldurico Alencar Pinto, alegando que ele seria o pai da criança.
Conhecido como Uldurico Júnior, ele foi candidato a prefeitura de Teixeira de Freitas em 2024 e seria o padrinho político de Joneuma.
Informações do processo, obtidas com exclusidade pela TV Bahia, apontam que Uldurico júnior foi visto muitas vezes visitando os presos em Eunápolis.
Um policial penal, que não teve o nome divulgado, disse em depoimento “ter conhecimento de que políticos ingressaram no conjunto penal, sem revista, inspeção ou cadastro prévio de visitantes”, e citou o ex-deputado.
O policial penal afirmou também que, sempre que o político chegava ao presídio, ele se retirava da unidade por considerar o ambiente sensível, e por não concordar com a ida do político nas condições descritas.
O homem disse também “ter recebido informações de Uldorico Pinto mantinha contato com presos que exerciam liderança dentro de facções criminosas durante suas visitas”, incluindo Dadá.
Em contato com a produção da reportagem, Uldurico Junior afirmou que não responde a nenhuma acusação e que tem pressa pra fazer o teste de DNA.
Denúncia contra envolvidos
O MP-BA ofereceu denúncia contra os indiciados em março deste ano. Além de Joneuma, Wellington e Dadá, estão os outros fugitivos.
Segundo detalham os depoimentos, antes de fugirem, os detentos, que eram aliados de Dadá, foram colocados na mesma cela, de número 44.
Antes de fugirem, eles tiveram acesso a uma furadeira e abriram um buraco no teto da unidade, no dia 29 de novembro. O barulho não passou despercebido por agentes penais, mas a diretora só teria tomado uma atitude dois dias depois.
Foi neste momento que, segundo o ex-coordenador de segurança da unidade , ele recebeu ordem de Joneuma para buscar a ferramenta na cela, juntamente com a equipe.
Os agentes retiraram os presos e, em uma inspeção superficial, encontraram a ferramenta, que, conforme pontuou Wellington, foi mantida pela ex-diretora penal na sala dela por alguns dias. Somente pouco antes da fuga que ela pediu que o subordinado levasse o objeto para a casa dela.
Atualmente, Wellington está preso no Conjunto Penal de Teixeira de Freitas.
Entenda a fuga
O Conjunto Penal de Eunapolis fica em uma área afastada do centro da cidade, no bairro Juca Rosa. A fuga contou com quatro veículos do tipo SUV e oito homens portando armas de grosso calibre.
Um dos envolvidos, identificado como Vagno Oliveira Batista, foi preso em fevereiro deste ano, portando uma pistola. Segundo as investigações, ele era responsável por cuidar do armamento da facção.
Em depoimento, o suspeito disse que, depois da fuga, foi até a favela da Rocinha, no Rio de Janeiro, onde encontrou com Dadá e outros cinco fugitivos.
Segundo depoimentos, antes de ser presa, Joneuma Silva Neres também planejava fugir para a capital carioca e se encontrar com o líder da quadrilha.
Conforme apontam as investigações, a ex-diretora teria recebido R$ 1,5 milhão da facção criminosa. A defesa dela nega.
O que diz a Seap
Em nota, a Secretaria de Administração Penitenciária e Ressocialização do Estado ((Seap) disse que jamais compactuou com qualquer privilégio concedido a internos custodiados no sistema prisional baiano.
A pasta pontuou ainda que participou ativamente com a Polícia Civil (PC) nas investigações e colaborou de forma irrestrita com a Justiça para punir todas as transgressões ocorridas no Conjunto Penal de Eunápolis.
Desde o final de maio, agentes da Força Penal Nacional estão operando no presídio. Adecisão foi tomada depois do atentado que teria como alvo o novo diretor Jorge Magno Alves, no dia 20 de maio, por ter endurecido a regras na unidade. Ele escapou do ataque, porém um servidor ficou gravemente ferido.
Com relação a fuga, até agora, apenas um fugitivo foi encontrado e foi morto na tentativa de prisão.
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