
Homem pede socorro com pano na varanda e bombeiros entram de rapel em apartamento
Um homem em surto psicótico foi resgatado pelo Corpo de Bombeiros após estender um pano com a mensagem pedindo socorro: “Querem me matar. Vou pular.” na fachada de um prédio em Santos, no litoral de São Paulo. A cena chamou atenção de moradores, que acionaram as autoridades. Os bombeiros entraram no apartamento por meio de rapel, e o homem foi encaminhado ao hospital.
O caso aconteceu por volta das 10h desta segunda-feira (11), em um condomínio localizado próximo à orla da praia, no bairro José Menino. Equipes da Polícia Militar (PM) e do Corpo de Bombeiros foram mobilizadas após o alerta dos moradores que visualizaram o aviso pendurado na varanda.
Segundo a PM, a síndica do prédio acompanhou os agentes até o apartamento, onde foi iniciada uma negociação com o morador. A operação durou cerca de duas horas e terminou com o resgate seguro do homem.
A Prefeitura de Santos informou que o homem foi levado pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) à Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Central. O g1 pediu mais detalhes ao Insaude, gestor da unidade, mas não obteve resposta até a última atualização.
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Imagens obtidas pela registram o momento em que três bombeiros acessaram a sacada do apartamento onde o morador estava, no 9º andar do edifício. Um dos agentes realizou o atendimento inicial e conduziu o homem para o interior do imóvel (veja acima).
Morador pendurou pano com pedido de socorro na sacada do apartamento em Santos, SP
g1 Santos
Ao mesmo tempo, uma equipe da Polícia Militar arrombou a porta de entrada do apartamento para prestar apoio. Segundo a corporação, o homem apresentou leve resistência, mas acabou aceitando o atendimento e deixou o local de forma segura. O caso foi apresentado no 7º DP de Santos.
O que é um surto psicótico e como tratar?
Ao g1, o psiquiatra do Instituto Merake Saúde Mental, Luan Diego Marques, explicou que o surto psicótico é um episódio repentino. O maior sintoma, segundo o médico, é a mudança repentina de comportamento, mas ela pode acontecer de forma gradual.
”Pessoas que, por exemplo, não são religiosas e, de uma hora pra outra, se tornam extremamente fieis é um sinal vermelho. Na psiquiatria, chamamos de comportamentos ‘bizarros’, são aleatórios e completamente contrários a personalidade do paciente”, diz o psiquiatra.
Luiza Sarsur Ribeiro, psiquiatra do Hospital Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), explica, ainda, que o surto psicótico é um episódio temporário do estado mental em que ocorre uma dissociação entre a realidade e a percepção que a pessoa tem dela, podendo haver alucinações, delírios, ansiedade, agressividade, pensamento desorganizado e/ou comportamento desorganizado.
”Durante um ‘surto psicótico’, com a presença de delírios ou alucinações, além de pensamentos desorganizados, o paciente sofre um amplo comprometimento do juízo crítico e da realidade”, diz a psiquiatra.
Sintomas de um surto psicótico
Mulher se olha em espelho quebrado em imagem ilustrativa à doenças psíquicas
Katarzyna Bialasiewicz/Getty Images
Segundo os especialistas, os principais sintomas do surto psicótico são as alucinações e os delírios, que causam uma perda de contato com a realidade. De acordo com a psiquiatra Luiza Ribeiro, as alucinações são experiências semelhantes à percepção, que ocorrem sem um estímulo externo, são vívidas e claras, com toda a força e o impacto das percepções normais, não estando sob controle voluntário.
“Esses episódios podem ocorrer em qualquer modalidade sensorial [pelos órgãos dos sentidos], como ouvir vozes, ver pessoas e objetos ou até sentir cheiros”, diz a médica.
Já os delírios são crenças fixas, não passíveis de mudança à luz de evidências reais que se argumente. Seu conteúdo pode incluir uma variedade de temas, como delírio persecutório(mania de perseguição), místico religioso, de grandeza, entre outros.
De acordo com o psiquiatra Luan Diego Marques, a maioria dos quadros de “surto'” apresenta delírio persecutório – chamado também de mania de perseguição – mas isso também depende das vivências de cada paciente.
”Uma pessoa ansiosa é mais passível de passar por um delírio persecutório por estar constantemente pensando que algo pode dar errado. Já uma pessoa religiosa, provavelmente terá um delírio religioso”, aponta o médico.
Outros sintomas comuns são:
Desorganização do pensamento: a pessoa começa a ter um discurso confuso, podendo mudar de um tópico a outro repentinamente e apresenta respostas e perguntas que podem ter uma relação oblíqua ou não ter relação alguma
Comportamento motor desorganizado ou anormal: o paciente pode ficar, de silencioso e imóvel, até agitado e agressivo, sem motivo aparente
Comportamento catatônico: ficar parado, sem qualquer reação, além de mostrar expressão emocional diminuída (emoções mostradas pelo rosto, no contato visual, na entonação da fala)
Falta de sociabilidade
Capacidade de discernimento comprometida: pacientes podem agir, falar, se comportar e se expressar de formas que não são coerentes com seu julgamento e entendimento racional
Oscilações bruscas de humor: rápidas mudanças de emoções, como medo, euforia, pânico e raiva
Quem pode ter um surto psicótico?
De acordo com os psiquiatras, em geral, o primeiro episódio psicótico tem origem orgânica, sem causas clínicas, uso de drogas e medicações – e não há como evitar que ele ocorra. O psiquiatra, Luan Diego Marques, destaca que é comum associar o ‘surto’ a pessoas violentas, mas relembra que qualquer pessoa que tenha uma mínima perda de juízo crítico pode ter um episódio.
De acordo com a psiquiatra Luiza Ribeiro, a psicose é um transtorno relativamente frequente, com uma incidência estimada entre 1.5 e 6.5 por 100 mil pessoas por ano, comparável com a incidência de doenças psiquiátricas como Transtorno Bipolar de Humor e Transtorno Esquizoafetivo .
“Os transtornos psicóticos são heterogêneos e a gravidade dos sintomas pode prever aspectos importantes da doença, como o grau de déficits cognitivos ou neurobiológicos”, diz a médica.
Em princípio, “qualquer indivíduo está sujeito a desenvolver um quadro psicótico”, aponta a especialista. “Nos quadros psiquiátricos primários, como esquizofrenia e bipolaridade, existem características de herdabilidade e de ligação à carga genética importantes, determinando que as pessoas que têm parentes de primeiro grau tenham mais chances de desenvolver estas mesmas patologias que outros indivíduos que não as têm”, explica.
Já o especialista, ressalta que além das carga genética importantes, outro fator que pode contribuir para uma futura crise é o ambiente do paciente. Uma criança com um elevado grau de estresse na primeira infância ou durante o desenvolvimento é mais suscetível desenvolver um surto.
“É importante que as pessoas próximas percebam mudanças comportamentais do paciente, e prestem atenção ao que ele fala, suas percepções da realidade e outros sintomas. Deve-se ficar atento e levar a um profissional especializado”, diz Luan Diego Marques .
Como agir diante de uma pessoa em surto psicótico?
Quando uma pessoa se mostra de maneira diferente da forma com que costuma agir, ou passa a ter comportamentos que a coloquem em risco, ou que tragam prejuízo – para si ou para os outros – o mais importante é, primeiro, acolher o amigo ou familiar “com calma”, dizem os médicos.
Após retirar a pessoa da situação imediata de perigo, a orientação é levá-la a um serviço médico.
Além disso, o psiquiatra Luan Diego Marques destaca que é essencial levar a sério o quadro do paciente. ”Muitos parentes têm receio de buscar ajuda e preferem fazer algo com viés religioso, isso não é o ideal. Essas pessoas precisam de auxílio psicológico e ajuda médica’.’
O que não fazer diante de um surto psicótico?
Os médicos alertam que não é recomendado partir para o confronto com as ideias delirantes, alucinações ou ilusões que a pessoa apresenta. “O mais indicado é acionar imediatamente um serviço profissional, como o SAMU, Corpo de Bombeiros ou uma clínica especializada para prestar socorro”, dizem os especialistas.
Qual o tratamento?
O tratamento para o surto psicótico tem início com a estabilização ou correção da sua causa, como suspender algum medicamento – se essa for a causa – ou administrar o antídoto adequado.
Em quadros psicóticos já estabelecidos, ao longo da vida, as melhores formas de evitar novos episódios, é a adesão ao tratamento medicamentoso, além do acompanhamento de uma equipe de saúde mental multidisciplinar.
“As medicações devem ser avaliadas de forma individualizada, em geral, com uso de antipsicóticos que podem ser associados a outras classes medicamentosas”, dizem os psiquiatras.
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