
Comprei um tênis pela internet. Posso devolver mesmo depois de experimentar? Entenda
Drazen Zigic/Freepik
O que acontece quando o tênis chega e não serve? Ou quando o conforto não é o prometido? Ou ainda, quando você simplesmente não gostou do calçado depois de ver ele no pé?
É aí que começa aquela chateação de procurar novamente a loja, pedir a troca ou a devolução, levar a encomenda até o correio e ficar na torcida para que o sapato seja aprovado pela análise do vendedor e você consiga seu reembolso.
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Para além de trocas por defeitos de fabricação, o direito de arrependimento é garantido ao consumidor em quaisquer compras feitas fora da loja física.
No entanto, algumas das condições descritas nas políticas das lojas, como o que significam as tais “marcas de uso” no calçado, podem confundir os consumidores e fazer com que a devolução ou troca sejam negadas.
Esse é um dos pontos que mais geram conflito entre consumidores e empresas, como mostram diversos relatos no site Reclame Aqui.
O Guia de Compras levantou dúvidas relatadas por clientes insatisfeitos com compras de calçados on-line e ouviu especialistas em direito do consumidor para esclarecer o que diz a lei. Veja abaixo.
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🛍️ Até quando posso devolver um produto comprado pela internet?
De acordo com o artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), você pode devolver uma compra feita fora do estabelecimento físico – ou seja, feita online, por telefone ou catálogo – em até sete dias corridos.
“O CDC prevê a possibilidade de desistência da compra em até sete dias, a contar da data da aquisição ou do recebimento do produto. Os valores pagos pelo consumidor deverão ser devolvidos. E o consumidor não precisa justificar o motivo pelo qual está cancelando a sua compra”, explica o Procon-SP.
Esse direito – chamado de “direito de arrependimento” – é assegurado mesmo que o produto não tenha defeito. O consumidor também não deve arcar com os custos da logística reversa, ou seja, do envio do produto de volta à loja.
Esse prazo foi criado justamente porque, segundo o órgão, “nas compras não presenciais, o consumidor não tem a oportunidade de experimentar o produto, avaliá-lo de perto e verificar se corresponde ao que está sendo ofertado”.
Por isso, o consumidor tem o direito de testar o produto em casa, e esse teste não pode ser usado como argumento para negar a devolução.
👟 Marcas de uso impedem a troca ou devolução?
De acordo com a política de trocas e devoluções de grandes lojas on-line, os produtos devolvidos costumam passar por análise de equipes especializadas das marcas, para verificar se ainda estão em condições de venda.
Por isso, uma das exigências para a devolução é que o produto esteja sem “marcas” ou “sinais de uso”. Mas o que isso significa?
Aqui é importante uma distinção: testar não é o mesmo que usar. Se você apenas experimentou o sapato dentro de casa para ver se estava dentro das expectativas, isso não deve impedir a devolução.
“Em geral, o que se entende por ‘marcas de uso’ são indícios de que o produto foi utilizado de forma que ultrapasse uma simples experimentação – como desgaste evidente, sujeira, arranhões ou alterações que dificultem a revenda do item como novo”, explica Christian Printes, gerente jurídico do Instituto de Defesa de Consumidores (Idec).
No entanto, “não existe uma caracterização legal para ‘marcas de uso’”, afirma o Procon-SP.
“Quando o consumidor testa o produto, ou seja, verifica se o mesmo atende suas expectativas, como tamanho, qualidade, conforto, estética, etc. (o que é diferente de ser utilizado no dia a dia efetivamente), o fornecedor não pode alegar que não procederá o cancelamento da compra”, diz o órgão.
Na prática, porém, isso nem sempre é respeitado. Um consumidor relatou, no Reclame Aqui, que tentou trocar um tênis comprado pela internet, mas a empresa recusou, alegando uso indevido, mesmo o cliente afirmando que apenas experimentou o calçado em casa.
Segundo Printes, há uma contradição entre a forma como as lojas tratam as vendas on-line e as feitas na loja física.
“Na loja física, o consumidor pode experimentar o calçado livremente, andar pelo ambiente, e, ainda assim, desistir da compra sem qualquer questionamento sobre marcas de uso”, diz o especialista.
“Já no ambiente on-line, muitas empresas tratam o produto como se não pudesse ser tocado, exigindo que esteja ‘intacto’, o que é incompatível com o exercício pleno do direito de arrependimento”, completa.
Para o gerente jurídico, essa diferença de tratamento não é justificável do ponto de vista do consumidor e configura prática abusiva quando usada para restringir indevidamente o direito de devolução.
“Sem critérios padronizados, as marcas acabam impondo suas próprias regras, muitas vezes de forma abusiva”, conclui Printes.
📷📝Como evitar dores de cabeça por causa das “marcas de uso”?
A recomendação do Procon-SP, nesses casos, é registrar provas. “Uma das ferramentas que o consumidor pode usar é fotografar o produto para mostrar que não constam marcas que denotem que o mesmo foi usado no dia a dia”, orienta o órgão.
Essas fotos podem ser enviadas junto ao pedido de devolução, se houver possibilidade disso. Caso contrário, o cliente pode avisar a loja que tem as imagens junto ao pedido.
Printes também orienta que o consumidor guarde as embalagens e etiquetas originais e evite usar o produto em ambientes externos antes de ter certeza de que gostou da compra. “Procure provar o calçado sobre um tapete limpo”, ensina.
✅ Veja mais algumas dicas dos especialistas para se proteger de problemas em compras de sapatos on-line, como falhas técnicas nos canais de atendimento (site, SAC e e-mail) e demora no reembolso:
Leia atentamente a política de trocas e devoluções da loja;
Guarde todos os registros da transação (comprovantes, e-mails, prints de conversa);
Faça fotos ou vídeos do produto logo ao receber, antes mesmo de experimentar;
Em caso de problema, tente resolver diretamente com a loja primeiro; se não for atendido, registre reclamação no site do Procon-SP.
📦 O que fazer se o tênis vier com defeito?
Se o problema for técnico, como costura solta, entressola danificada ou qualquer defeito de fabricação, o Procon-SP informa que o fornecedor tem um prazo de 30 dias para resolver. E isso vale tanto para compras on-line quanto presenciais.
Se isso não acontecer, o consumidor pode escolher entre a troca do produto, a devolução integral do valor pago ou o abatimento proporcional no preço.
Para isso, é essencial guardar registros da reclamação: número de protocolo, data de envio da solicitação e qualquer resposta da empresa. O Procon destaca a importância de comprovar que a reclamação foi feita dentro do prazo.
📞 Como registrar uma reclamação se a loja não resolver?
Se a empresa se recusar a aceitar a devolução ou a consertar o defeito, o consumidor tem o direito de procurar ajuda do Procon ou outros órgãos de defesa do consumidor, pela internet.
Esses órgãos atuam como mediadores, tentando uma solução amigável com base no que prevê a legislação. Quando identificam uma prática reiterada ou abusiva por parte da empresa, podem também aplicar sanções administrativas, como multas.
Já as entidades de defesa do consumidor, como o Idec, oferecem orientação jurídica a seus associados, além de denunciar práticas abusivas às autoridades competentes.
De acordo com Christian Printes, do Idec, se a empresa continuar a descumprir a lei, o consumidor pode recorrer ao Juizado Especial Cível, onde pode propor ações de pequeno valor sem necessidade de advogado.
O g1 também contatou a Centauro, a Mizuno, a Netshoes, a New Balance e a Track&Field, que declinaram participar na reportagem, e a Dafiti, que não respondeu até a data da publicação.
Abaixo, veja sapatos por R$ 100 a R$ 250, consultados no início de agosto nas principais lojas da internet.
Tênis Asics Ugoki feminino
Chinelo Jordan Post S masculino
Tênis Adidas Stan Smith feminino
Tênis Everlast Berlin Running Training feminino
Tênis Kipling Lime Green
Tênis Olympikus Venum
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