Felca tem vitórias na Justiça de SP contra redes sociais por acusações de pornografia infantil e perfis desativados sem aviso


Quem é Felca, youtuber que denunciou o influencer Hytalo Santos por exploração de menores
O youtuber e humorista Felipe Bressanim Pereira, mais conhecido como Felca, já obteve vitórias na Justiça de São Paulo em processos contra as redes sociais TikTok e X (antigo Twitter) em janeiro e julho deste ano, em ações movidas por perfis desativados sem aviso e por publicações com acusações de pornografia infantil.
Na última sexta-feira (8), Felca processou 233 perfis do X por calúnia e difamação após ser chamado de pedófilo e abusador. O processo foi protocolado dois dias após ele publicar o vídeo intitulado “Adultização” em que denunciou o influenciador paraibano Hytalo Santos por exploração de menores e alertou sobre os riscos das redes para crianças e adolescentes (veja mais abaixo).
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No caso contra o TikTok, os autos apontam que, em 25 de setembro de 2023, duas contas profissionais do influenciador foram suspensas sob alegação genérica de violação das regras da plataforma, sem detalhar qual norma teria sido descumprida. Os perfis eram utilizados para divulgação de conteúdo e geração de receita.
Felca e sua equipe tentaram diversas vezes contato com o TikTok, mas não obtiveram respostas adequadas, e o bloqueio permaneceu. Ele, então, entrou na Justiça para exigir a reativação das contas e indenização por danos morais.
A sentença determinou que a Bytedance Brasil Tecnologia Ltda., responsável pelo TikTok, reativasse imediatamente os perfis e pagasse R$ 10 mil de indenização, entendendo que a suspensão sem explicação e sem direito ao contraditório configurou falha na prestação de serviço.
A empresa recorreu, alegando violação dos termos de uso e pedindo a reversão da decisão ou a redução do valor. Em 17 de julho deste ano, a 25ª Câmara de Direito Privado negou o recurso, mantendo a condenação.
Para os desembargadores, a suspensão ocorreu sem justificativa adequada, violando o Código de Defesa do Consumidor e o Marco Civil da Internet, que garantem transparência e direito de defesa.
O g1 procurou a assessoria do TikTok, mas não obteve resposta até a publicação desta reportagem.
Já a ação contra o Twitter Brasil, hoje X, foi julgada em 15 de janeiro pela 7ª Câmara de Direito Privado. Felca conseguiu a remoção temporária de uma postagem com acusações falsas e difamatórias, incluindo a insinuação de consumo de pornografia infantil.
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Segundo os autos, a primeira instância havia negado o pedido de urgência, mas o TJ-SP reformou a decisão e determinou a retirada temporária de uma postagem específica, identificada por uma URL. Outras três publicações citadas pelo influenciador já haviam sido apagadas por seus autores ou pela própria plataforma.
O tribunal entendeu que havia probabilidade de direito e risco de dano irreparável à imagem de Felca, considerando seu alcance (mais de 800 mil seguidores) e o impacto de uma das postagens, vista mais de 1,6 milhão de vezes. Também observou que a medida não causaria prejuízo à rede social, que já havia cumprido a ordem.
Ameaças, uso de carro blindado e seguranças
Felca pediu a quebra de sigilo de 233 perfis na plataforma X após ser difamado na rede social
Reprodução/Canal Youtube
Felca revelou durante entrevista ao podcast PodDelas que passou a andar com carro blindado e seguranças na capital paulista, onde mora, para se proteger de ameaças depois de publicar vídeos com denúncias.
“[Estou recebendo] muitas [ameaças], de assuntos delicados. Muitas, muitas. Comecei a andar com carro blindado e segurança. Muitas ameaças, sim. A questão das bets, por exemplo, vieram muitas ameaças. A questão da adultização existe uma ameaça de processo. Provavelmente existe e a gente conta com isso, que vai existir alguns processos aí. Mas é o lado da verdade. Se ninguém fala, ninguém vai falar”, afirmou, ao ser questionado se havia recebido ameaças por conta de seus vídeos.
O youtuber ganhou destaque ao se posicionar contra o envolvimento de influenciadores com apostas esportivas, conhecidas como bets, criticando a forma como as plataformas são divulgadas nas redes.
Já no vídeo mais recente, de 50 minutos, ele fez um compilado de denúncias sobre influenciadores que abusam da imagem de crianças. Também relatou como o algoritmo funciona para divulgar esse tipo de conteúdo.
A denúncia de Felca viralizou e reacendeu o debate público sobre a exposição de crianças e os direitos delas na internet. Só no Instagram, o vídeo intitulado “Adultização” tem mais de 100 milhões de visualizações.
“A gente fala sobre esses casos e de como algoritmo favorece. Você vê que o público dessa criança, por exemplo, não são pessoas que estão engajadas no conteúdo que a criança está fazendo. É um público de pedófilos. Você vê nos comentários que são pessoas mandando coraçãozinho, falando para mostrar mais. Os pais incentivam isso porque eles entendem que existe o universo de consumidores sobre isso. Os vídeos monetizam, e os pais expõem a criança a isso”, afirmou ele na entrevista ao podcast PodDelas.
O youtuber também afirmou que levou cerca de um ano para fazer o vídeo e ouviu uma psicóloga para explicar sobre adultização.
“Quando eu tive a ideia de fazer o vídeo, foi há mais de um ano. Esse vídeo demorou muito para fazer, porque a gente teve que procurar psicóloga, a gente teve uma entrevista com a psicóloga falando sobre adultização. É uma psicóloga maravilhosa de São Paulo, especializada em criança”, contou.
“Eu realmente mergulhei no lamaçal. Foi muito aversivo fazer esse vídeo. É terrível a gente olhar essas cenas. Dá vontade de chorar, de vomitar, é terrível. Mergulhei no lamaçal. O que a gente está fazendo aqui é uma gota no oceano. Mas, sem essa gota, o oceano seria menor. Então, vale a pena fazer”, ressaltou.
A conta de Hytalo Santos saiu do ar no Instagram, mas não há a confirmação de que isso tem relação com a denúncia de Felca. O Ministério Público disse que apura, desde 2024, outras denúncias contra o paraibano também por exploração de menores.
Em entrevista ao Conexão GloboNews na manhã desta segunda-feira (11), a juíza Vanessa Cavalieri, da Vara da Infância e Juventude do Rio de Janeiro, falou sobre urgência do assunto.
“A internet é um lugar público e perigoso. Então, da mesma forma que você não vai imprimir mil fotos do seu filho e sair distribuindo para qualquer estranho que passar na rua, você também não deve postar essas fotos no ambiente digital”, disse Vanessa.
Redes sociais e os perigos para crianças e adolescentes
A juíza alertou que, muitas vezes, a publicação de imagens de crianças e adolescentes nas redes sociais pode facilitar o acesso de criminosos, que utilizam esses conteúdos para cometer crimes.
“Quando um pai e uma mãe postam fotos e vídeos dos filhos pequenos em perfis de redes sociais abertos ou mesmo fechados, eles estão entregando esse material de bandeja para predadores sexuais, para pedófilos”, alertou.
Ela também falou sobre o conceito de “sharenting”, a exposição de conteúdos pelos pais na internet: “É importante lembrar que a imagem dos filhos pertence aos filhos, não aos pais. Nós não somos donos dos conteúdos dos nossos filhos, e é injusto a gente usar essa imagem só porque eles são pequenos”.
Quem é Felca
Felca é natural de Londrina, no norte do Paraná, mas atualmente mora em São Paulo. Ele possui mais de 5,23 milhões de inscritos no canal dele no Youtube, que foi criado em julho de 2017. No Instagram, são mais de 13,7 milhões de seguidores.
Ele ficou famoso ao publicar vídeos de reacts, conteúdos em que pessoas falam sobre as suas reações com produtos ou serviços ou até sobre outros vídeos, e conteúdos humorísticos.
Em setembro de 2023, o g1 conversou com o youtuber sobre as lives NPC, após ele conquistar 1 milhão de seguidores no Tik Tok em apenas quatro dias.
Projeto de lei
No Conexão, a juíza Vanessa Cavalieri destacou que tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 2628/2022, que já foi aprovado no Senado. A proposta cria regras para proteger crianças e adolescentes no ambiente digital.
Ela se aplica a qualquer produto ou serviço de tecnologia da informação — como redes sociais, aplicativos, jogos online e serviços de monitoramento — que possa ser usado por crianças e adolescentes, mesmo que a empresa esteja fora do Brasil.
“A discussão deve ser suprapartidária, não importa qual a orientação política de cada um. Essa urgência da proteção das crianças e dos adolescentes no ambiente virtual não pode ser sequestrada pela polarização política”, aponta a magistrada.
“Porque é interesse de todo mundo que as crianças e os adolescentes não estejam sujeitos a violência, a mortes, a instigação de automutilação, a serem cooptados por criminosos, a serem vítimas de predadores sexuais”, continua.
“É preciso que o poder público faça leis para que as plataformas, as empresas que lucram bilhões de dólares anualmente com essa atividade, sejam responsabilizadas por cumprir as regras que elas próprias colocam, como a idade mínima para usar, para estar nas redes, em alguns, algumas plataformas é 13 anos, outras é 16, outras é 18 anos, e a gente sabe que muito antes disso as crianças acabam usando”, pontua.
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