Com ruídos da própria voz, orquestra de cordas e sons criados por IA, Clarice Assad compõe trilha de Piracema para o Grupo Corpo

Três movimentos — tribal, clássico e eletrônico — compõem a trilha de Piracema, a primeira em 50 anos de história do Grupo Corpo, composta por uma mulher: Clarice Assad.
A compositora e pianista, que tem mais de 70 obras no currículo e já foi indicada ao Grammy, nasceu no Rio de Janeiro, mas mora há anos fora do país.
A sugestão do nome dela para criação da trilha sonora do novo espetáculo do Grupo Corpo foi de outra mulher: a artista plástica, Laura Vinte. Ela é esposa de José Miguel Wisnik, autor de diversas trilhas para o Grupo Corpo e que acabou virando uma espécie de consultor do diretor artístico do grupo, Paulo Pederneiras, quando o assunto é trilha sonora.
Quando recebeu o convite, Clarice disse que ficou surpresa, mas também muito feliz já acompanha há anos as criações da companhia, e se diz “absolutamente fã”.
“É a primeira vez na história do grupo que eles encomendam uma mulher pra fazer uma trilha, e isso vem também com muita responsabilidade, para mim e um carinho também pelas mulheres compositoras do Brasil, que vieram antes de mim que ainda estão aí fazendo coisas incríveis. A gente sempre esteve aqui, mas agora estamos recebendo mais visibilidade, […] porque eu acho que faz parte né? da nossa evolução, de que precisamos realmente fazer um esforço para nossas vozes sejam ouvidas cada vez mais, disse Clarice”.
Sobre a trilha
A trilha de Piracema levou um ano para ser feita e é estruturada em três grandes momentos. O primeiro se desenrola em um ambiente natural, tribal e intocado. No segundo, destaca-se a polifonia sinfônica da música clássica. Já o terceiro momento traz uma sonoridade urbana e contemporânea, marcada pela presença da música eletrônica.
Segundo a compositora Clarice Assad, os três movimentos resumem os desafios que estamos vivendo, como as mudanças climáticas, a relação com os outros seres vivos e com o mar de tecnologia no qual todos nós estamos mergulhados.
“Eu acho que a trilha fala dessas coisas todas como um momento de colisão né? de destruição de tudo, do antigo para que algo novo floresça e seja melhor. Eu acho que o ser humano tem na maior parte da população, na maior parte das vezes, tem vontade de ser melhor do que é e chegou o momento da gente se unir para que isso aconteça, para que mais vozes sejam escutadas, para que mais causam sejam de fato olhadas com atenção”, disse a compositora.
Apesar do tom de alerta, Clarice acredita que, no fim das contas, a trilha transmite esperança no futuro. “Ela vai assim pra um lugar de acalanto no coração.”  
Para chegar ao resultado, Clarice trabalhou com o percussionista Keita Ogawa, com a orquestra de cordas New Century Chamber, de São Francisco, e contou com participações especiais como a do pai, o violonista e compositor Sérgio Assad.
A compositora também usou a própria voz para fazer harmonias vocais e na terceira parte da trilha, se valeu da inteligência artificial para gerar ruídos e sons.
“No final das contas, foi um quebra-cabeças que o Corpo e eu montamos lado a lado, criando um panorama de evolução, mudança e revolução do mundo. E ainda não sabemos se caminhamos para uma utopia ou uma distopia. Mas o poder regenerativo da arte é real, disse ela.”
Adicionar aos favoritos o Link permanente.