Bem-estar animal em rodeios: veja como funciona a fiscalização e quais as falhas apontadas por ativistas


Na semana em que começa a Festa do Peão de Americana, g1 mostra como funciona a inspeção, que, no Brasil, tem responsabilidades distribuídas entre as esferas federal, estadual e municipal. Entenda com é feita a fiscalização do bem-estar animal em rodeios
A fiscalização do bem-estar animal em rodeios no Brasil envolve uma rede de responsabilidades distribuídas entre as esferas federal, estadual e municipal. Apesar das regulamentações existentes, a eficácia destas medidas é questionada por ativistas que apontam falhas na proteção dos touros e cavalos envolvidos nas competições.
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A advogada Caroline Ferreira Salioni, membro da Comissão de Direito e Defesa dos Animais da OAB de Ribeirão Preto, critica a permissividade das leis que regularizam os rodeios. Para ela, a regulamentação acaba legitimando uma atividade que, por natureza, causa sofrimento.
“A própria lei já institucionaliza certas práticas de maus tratos. Então, assim, a própria lei já é inconstitucional”, diz Caroline.
Enquanto órgãos e representantes do setor defendem que os rodeios seguem normas rigorosas de fiscalização, ativistas defensores do direito animal apresentam argumentos contrários à prática, além de estudos que apontam evidências de dor e estresse nos animais.
Na semana em que começa a Festa do Peão de Americana, o g1 mostra como funciona a fiscalização de animais em rodeios e quais as críticas apontadas por quem é contrário. Veja detalhes no vídeo.
Nesta reportagem você vai ver
Como funciona a fiscalização por instâncias?
Críticas
Pesquisas
🤔 Como funciona a fiscalização por instâncias?
César Fabiano Vilela, médico veterinário responsável pelos eventos no Brasil da Professional Bull Riders (PBR), principal liga de montaria em touros do mundo, afirmou que a inspeção ocorre em três instâncias diferentes e, mesmo tendo papéis distintos, são complementares na garantia dos direitos dos animais.
“A gente se baliza a partir do quê? De conhecimento técnico, científico. Então, hoje existe, inclusive, essa cobrança que a sociedade fez e tudo mais. Fez, inclusive, a comunidade científica estudar melhor essas questões”, disse Vilela.
Saiba mais sobre as instâncias de fiscalização:
1️⃣Federal :
O Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) é o órgão máximo no país que regula as políticas de bem-estar animal, com base nas diretrizes da Organização Mundial de Saúde Animal (OMSE). Ele é responsável por traçar programas como o Programa Nacional de Sanidade dos Equídeos (PNSE), que incluem protocolos específicos sobre bem-estar.
2️⃣Estadual:

Na esfera estadual, a fiscalização sanitária é feita pelos órgãos de defesa agropecuária, ligados à Secretaria de Agricultura. No estado de São Paulo, essa atribuição é da Coordenadoria de Defesa Agropecuária (CDA-SP), que, segundo o veterinário, é responsável por autorizar os eventos mediante o cumprimento de exigências sanitárias e de bem-estar.
De acordo com a Secretaria de Agricultura e Abastecimento de São Paulo, a fiscalização sanitária dos eventos é realizada com base na Resolução SAA nº 14, que recomenda os procedimentos de bem-estar animal para eventos de concentração no Estado de São Paulo.
3️⃣Municipal:
Já nas cidades onde os eventos são realizados, a responsabilidade recai sobre as prefeituras. Elas são encarregadas de conceder licenças, garantir a estrutura adequada e verificar o cumprimento da legislação vigente, já que cada cidade pode ter um regulamento específico.
🔍 Em Campinas, por exemplo, o artigo 1 da Lei nº 11.492/2003 proibe “a utilização de animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou não, adestrados ou não, em espetáculos circenses ou similares realizados no Município”.
4️⃣Ministério Público:
O Ministério Público também pode atuar em casos que envolvem possíveis danos ambientais ou maus-tratos a animais.
De acordo com o veterinário da PBR, a atuação do MP envolve instaurar inquéritos, promover ações civis e penais, além de realizar visitas e inspeções pontuais nos rodeios para verificar se as normas de bem-estar animal estão sendo seguidas.
Competições de montarias em touros no Rodeio de Americana
Júlio César Costa
❌Críticas
Para a advogada Caroline Ferreira Salioni, o principal problema da realização de rodeios não está nas falhas presentes no processo de fiscalização, mas na legalização da prática em si.
Ela destaca que o ordenamento jurídico deveria considerar os rodeios como eventos incompatíveis com os princípios de proteção animal.
“A própria lei inconstitucionaliza algumas questões. Então, assim, por mais que os órgãos estejam ali fiscalizando, todos ali estão coniventes com as práticas, é intrínseca a violência. Não tem como falar: ‘ah, é possível haver uma fiscalização de bem-estar animal’. Não tem como, porque já está acontecendo à violação”, explicou a advogada.
Caroline ainda questiona a visão cultural dos rodeios, que segundo ela, muitas vezes é usada para justificar a realização do evento.
“Hoje em dia, as pessoas vão muito mais pelos eventos artísticos, vão para ver os cantores sertanejos, é possível tudo isso existir sem utilizar o animal”, comentou a advogada.
🔍Pesquisas
Além do embasamento jurídico, Caroline também citou estudos científicos que mostram os impactos físicos e psicológicos que os rodeios causam nos animais. De acordo com ela, as ferramentas utilizadas durante as provas, além das luzes e sons presentes no ambiente, provocam dor e estresse aos bois, cavalos e bezerros.
A advogada explicou que uma das pesquisas mais relevantes nesse sentido foi realizada pela União Internacional Protetora dos Animais (UIPA).
Intitulada como “Cruéis Rodeios”, o estudo aponta que a exposição constante dos animais a ambientes de arena compromete seriamente o bem-estar físico e mental, provocando estresse intenso, medo e traumas comportamentais duradouros.
Segundo o estudo, mesmo quando não há ferimentos visíveis, os animais submetidos a provas de montaria são forçados a reagir com comportamentos de defesa por meio de estímulos dolorosos, como o uso do sedém e de esporas.
Esses estímulos provocam reações involuntárias, como coices e pulos, erroneamente interpretadas como sinais de força ou resistência, quando na verdade são reflexos de dor e desespero.
Para Caroline, a pesquisa reforça que a crueldade está na essência da prática, independentemente das tentativas de regulamentação.
“Até que ponto está havendo um bem-estar, e mesmo que for fiscalizado, está fiscalizando o que, exatamente? Porque ele já está sendo violado […] Não é porque a gente tem uma lei que regulamenta que é uma lei moral”, afirmou a advogada.
*Sob a supervisão de Marcello Carvalho
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