
Em um cenário global onde a sustentabilidade se tornou uma prioridade, Santa Catarina tem se destacado como um dos principais polos da transição para uma economia de baixo carbono. O estado conta com uma indústria pujante, mas atenta às questões socioambientais. Com o mundo atento ao processo de transição energética, o setor produtivo local busca soluções e um novo posicionamento visando mitigar as emissões de gases do efeito estufa e reduzir impactos ao meio ambiente.
Entre os exemplos, está uma iniciativa que possui uma meta ambiciosa: tratar 100% dos dejetos gerados nas propriedades que demandam licenciamento ambiental em Santa Catarina nos próximos dez anos. Outras ações miram na economia circular, com projetos de reutilização de resíduos na produção de tijolos e produção de fibras têxteis a partir de resíduos de bananas, por exemplo.
Na prática, a Federação das Indústrias de Santa Catarina (Fiesc) atua por meio do Hub de Descarbonização, uma demanda das próprias empresas do setor, explica Charles Leber, pesquisador do Instituto SENAI de Tecnologia Ambiental.
“O estado se posiciona, tentando estar à frente e buscando soluções de maneira mais rápida possível. Temos diversas outras pequenas, médias e grandes empresas aqui do estado que atuam no desenvolvimento de produtos e tecnologias para a descarbonização. Podemos citar, por exemplo, a WEG, com uma extensa linha de produtos de geração de energia renovável. A MWM Tupi, também, que tem uma atuação muito forte em projetos de geração de biogás biometano, conversão de frota para gás natural ou biometano”.
Surgindo como uma demanda dos industriais em 2023, o Hub de Descarbonização é um movimento liderado pela Fiesc, mas, ao contrário da rede de institutos de inovação e tecnologia, não possui pretensão de se tornar uma estrutura física.
“Ele é um movimento transversal, onde toda essa rede de institutos que o SENAI tem funciona como um braço técnico da execução dos projetos do Hub”, completa.
No ano passado, o Hub realizou um inventário setorial de gás de efeito estufa em Santa Catarina, justamente para entender onde estão as emissões e o que as empresas estão fazendo em relação a isso, buscando novas frentes de atuação baseado em dados técnicos, em coleta de campo.
Além disso, auxiliou Unisenai, que é o Centro Universitário do SENAI Santa Catarina, no desenvolvimento de um MBA em descarbonização e economia verde, visando a geração e disseminação do conhecimento sobre o assunto.
O Hub trabalha ainda na criação de verticais temáticas de descarbonização, estruturas criadas com o objetivo de sugerir soluções por descarbonização dentro de um grupo de empresas que estão na mesma cadeia produtiva ou no mesmo setor produtivo.
Transformando desafios em oportunidades: Descarbonização da cadeia da proteína animal
O estado catarinense vem desenvolvendo o programa Biogás SC, que foi resultado da vertical temática de descarbonização da cadeia da proteína animal, a primeira criada pelo Hub. A iniciativa do estado de Santa Catarina visa fomentar a produção de energia renovável a partir de resíduos orgânicos, como dejetos suínos, fortalecendo o setor produtivo, promovendo a sustentabilidade e reduzindo as emissões de gases do efeito estufa. Enquanto isso, o Hub trabalha na conexão de indústrias e produtores de suínos do setor com instituições, fornecedores e outros players desse mercado, por meio de uma plataforma integrada.
O pesquisador do Instituto SENAI detalha que uma das principais soluções para o tratamento desses dejetos, com mitigação das emissões de gás de efeito estufa e geração de energia, é a biodigestão, por meio da a produção de biogás a partir de dejetos suínos. Hoje, Santa Catarina é o maior exportador de carne suína do Brasil, com um terço da produção brasileira, o que traz um grande potencial para produção de energia a partir dos dejetos suínos. O estado conta com cerca de 9 mil produtores comerciais de suínos, fornecedores para a agroindústria, mas desse montante, menos de 3% declara já ter biodigestão nas suas propriedades, de acordo com o especialista.
“Existe um gap muito grande. Existe um potencial muito grande de geração de biogás. Porém, ao mesmo tempo, também identificamos que a tecnologia de biodigestão não foi inventada pelo hub, não foi inventada pelo programa. Ela já existe há muitos e muitos anos. Agora, o fato é que ele nunca ganhou escala aqui no estado. Então, identificamos também que o desafio não é tecnológico, pois a tecnologia já existe e está disponível para quem quiser. O desafio é mais de gestão mesmo dessas propriedades para conseguir viabilizar a produção de biogás”, explica o especialista.
Assim, o programa Biogás SC desenvolveu uma plataforma de gestão desses produtores onde, a partir de informações fornecidas à ferramenta, são desenvolvidos planos de negócio personalizados para cada um desses produtores. Dessa forma, o produtor não precisa mais se adaptar ao modelo de produção de biogás que vem de fora, que seria indicado por algum fornecedor, com adaptação local. O fluxo foi invertido.
O plano de negócios é desenvolvido para a realidade daquele produtor, que irá avaliar se é viável ou não gerar biogás a partir de biodigestão na sua propriedade, a depender do valor do investimento e tempo de retorno. A plataforma indica ainda qual será a mitigação prevista com ações indicadas nessa estratégia.
O programa final está em fase de desenvolvimento, com utilização, neste momento, de uma ferramenta piloto, usada em escala reduzida, com 50 produtores catarinenses. A entrega completa está prevista para entre os meses de novembro e dezembro de 2025.