Campo de Santana enfrenta ‘seca’, sujeira e má conservação


Espaço de acontecimentos marcantes do país — como a coroação de Dom João VI (1818), a aclamação de Dom Pedro I (1822) e o fim do Império, com a Proclamação da República (1889) —, o Campo de Santana, no Centro do Rio de Janeiro, sofre em sua história recente com o abandono.
O g1 esteve na área esta semana e registrou lagos secos e sujos, chafarizes parados, bancos quebrados e postes de luz com fiação exposta — problemas já mostrados em outras ocasiões, como em 2023 e em 2019.
O abandono de animais, a presença de sem-teto e a insegurança são outras mazelas observadas ao longo dos últimos anos.
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Lago do Campo de Santana está seco
Betinho Casas Novas/g1
Reforma prometida não saiu
O Campo de Santana é tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e compreende 155 mil metros quadrados de verde às margens da Avenida Presidente Vargas, em um dos quarteirões mais movimentados do Centro, entre a Central do Brasil e o Hospital Municipal Souza Aguiar.
Em 2022, as secretarias da Casa Civil e do Ambiente, a Prefeitura do Rio e o Tribunal de Conta do Estado (TCE-RJ) assinaram um convênio, de R$ 15 milhões, para a revitalização do local. Os recursos seriam uma sobra orçamentária da Corte.
À época, estado e prefeitura disseram que o objetivo do convênio era “melhorar a qualidade ambiental do espaço”. Previram recuperar “jardins, lagos e monumentos” e preservar árvores, como “as majestosas figueiras”. Além disso, haveria a reabertura dos banheiros e “um novo sistema de vigilância eletrônica”.
Haveria ainda a restauração dos históricos portões do campo. Fabricados em 1873 na fundição francesa Val D’Osne, sob encomenda do paisagista francês Auguste Marie Glaziou, e trazidos de navio 3 anos depois, os portões de ferro fundido — que depois ganharam o brasão da República que ostentam até hoje — estão no parque desde 1880.
No entanto, 3 anos depois, segundo a Prefeitura, apenas R$ 900 mil teriam sido repassados à Fundação Parques e Jardins pela Secretaria de Meio Ambiente, o que teria inviabilizado o início das obras.
Em junho deste ano, porém, o prefeito Eduardo Paes (PSD) disse que não precisava do dinheiro do TCE e essa verba deveria ser entregue ao governo estadual para reforçar áreas como saúde, educação e transporte.
“Não quero dinheiro dado, doado, de quem não tem dinheiro. Eu acho absurdo o Tribunal de Contas decidir aonde vai o orçamento público. Quem decide para onde vai o orçamento público são os representantes eleitos pelo voto popular”, disse o prefeito durante o anúncio do lançamento do edital de concessão de 6 parques municipais à iniciativa privada. Paes não explicou como o município vai reformar o parque.
Ao g1, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) informou que existe uma “auditoria governamental de acompanhamento da transferência e aplicação de recursos orçamentários e financeiros do Governo do Estado, em convênio com a Fundação Parques e Jardins”.
De acordo com o TCE, “ainda não houve decisão monocrática ou deliberação no plenário desta corte de contas”.
Frequentadores listam problemas
Enquanto diferentes instâncias de poder debatem os recursos para uma reforma, frequentadores do Campo se queixam do abadnono.
“A gente vê que está muito abandonado. Tudo muito largado. A gente fica com medo de passar. Por ser um local público, poderia ter uma melhor atenção”, contou a auxiliar administrativo Sumara dos Santos da Silva.
“Na minha infância, meus pais me traziam aqui para passear, e hoje eu não posso trazer a minha filha, porque é perigoso. Eles poderiam dar mais atenção. À noite? Deus me livre. Se durante o dia já está largado, imagina à noite. Corre risco de ser assaltado sim”, emendou.
Vanilza Medeiros é moradora do Centro do Rio. A mulher ponderou que o Campo de Santana poderia ser conservado e cuidado assim como a Quinta da Boa Vista, a 5 km dali.
“Eu vejo que está um pouco abandonado. Eu viria aqui com a minha família, mas não tem jeito. Tem muita pessoa em situação de rua, e você não vê um segurança. Só vê o pessoal da Comlurb limpando. O pessoal só passa para atravessar e não para. Aqui tem muitas árvores antigas que dariam para o pessoal descansar. Poderia melhorar muito”, destaca Vanilza.
Luciane Carvalho faz parte de uma ONG de protetores de animais e vai diariamente ao local para tratar dos bichos. O local abriga gatos, cotias, pavões, entre outros animais.
“Teríamos que ter uma infraestrutura melhor para eles, como casinha, para eles se abrigarem. Isso é muito importante. Seria bom se a estrutura do parque, como os lagos, fosse ativada. Fundamental ter locais onde eles pudessem dormir e se abrigar. Precisamos de rações para eles, de medicações”, destacou.
O que dizem as autoridades
Em nota, a Prefeitura do Rio disse que assinou o termo de distrato com o Tribunal de Contas do Estado sobre o convênio para destinar recursos ao Campo de Santana. O município não informou o motivo da desistência. Segundo o comunicado, “os R$ 900 mil que foram depositados pela Secretaria Estadual do Ambiente e Sustentabilidade serão devolvidos com juros e correção monetária, nesta semana, pela Fundação Parques e Jardins. Serão R$ 949.038,46.”
Na nota, a assessoria de imprensa da prefeitura afirma que “a Prefeitura faz a manutenção do Campo de Santana. Os animais recebem cuidados diários e alimentação adequada. A Comlurb realiza diariamente a limpeza e a remoção de resíduos e o corte da vegetação.”
Em relação as pessoas em situação de rua, a Secretaria de Municipal de Assistência Social disse que, “em julho de 2025, foram realizados 1.078 atendimentos no entorno do Campo de Santana, com 839 acolhimentos.”
A Guarda Municipal disse apenas que mantém patrulhamento preventivo no parque. O Governo do Estado também foi procurado e não respondeu.
Já o Segurança Presente limitou-se a dizer disse que “não atua na área interna do Campo de Santana”. O órgão não informou como é a vigilância no entorno do parque nem o número de pessoas abordadas ou de armas ou facas apreendidas.
A Polícia Militar também não disse quantas pessoas foram presas ou apreendidas nos últimos meses praticando algum tipo de crime na região do parque. A pasta também não informou o que apreendeu no entorno do espaço.
Segundo o comando do 5º BPM (Centro), o policiamento é feito por uma viatura baseada bem em frente ao Campo de Santana, que atende tanto o entorno como a Avenida Presidente Vargas, com visibilidade para a Central do Brasil.
O Tribunal de Contas do Estado (TCE) disse que “em 2022, houve a sugestão, por parte tribunal [conduzido pelo então presidente Rodrigo Melo do Nascimento] para que o Governo do Estado destinasse o valor de R$ 15 milhões em forma de convênio com a Prefeitura do Rio para reforma do parque Campo de Santana. À época, a sugestão do TCE-RJ foi que se utilizasse verba proveniente de sobras orçamentárias devolvidas ao estado”.
Ainda de acordo com a nota, há a “existência de auditoria governamental de acompanhamento da transferência e aplicação de recursos orçamentários e financeiros do governo, em convênio com a Fundação Parques e Jardins”.
Fotos do parque
Acabamentos da grade foram furtados em vários pontos
Betinho Casas Novas/g1
Fiação exposta em poste no Campo de Santana
Betinho Casas Novas/g1
Espelho d’água do Campo de Santana está seco
Betinho Casas Novas/g1
ONGs cuidam de dezenas de bichos abandonados no Campo de Santana
Betinho Casas Novas/g1
Sem-teto dorme no gramado do Campo de Santana
Betinho Casas Novas/g1
Garis da Comlurb tentam manter o parque limpo
Betinho Casas Novas/g1
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