
VÍDEO: escola técnica fundada há 80 anos no interior de SP tem área abandonada
Os azulejos azuis e brancos pintados à mão pelo artista plástico Antonio Paim Vieira, intactos há oito décadas, decoram a fachada da Escola Técnica Estadual (Etec) Professor Edson Galvão, no bairro Capão Alto, em Itapetininga (SP). As peças feitas pelo artista paulista também foram produzidas para outras unidades de ensino técnico e retratam trabalhadores rurais preparando o solo.
A professora de história Monica Maria Toscani Cseri Ricardo e o diretor da unidade, Renato Walter, contaram ao g1 a história da instituição, fundada para a formação profissional dos filhos de trabalhadores rurais.
📲 Participe do canal do g1 Itapetininga e Região no WhatsApp
O prédio, construído em 1945, carrega mais do que a trajetória da formação de alunos interessados pelo setor agrícola; a sua estrutura neocolonial também está marcada pelas mudanças da história.
No desenvolvimento de uma pesquisa acadêmica para a conclusão do seu mestrado, Monica encontrou em documentos antigos da unidade mais informações sobre a Etec Professor Edson Galvão, também conhecida como antiga Escola Prática de Agricultura de Itapetininga.
A professora já trabalhava ensinando história na unidade, mas sempre teve curiosidade sobre o passado do local e imaginava que outras pessoas também poderiam se sentir assim.
Azulejos pintados à mão decoram a fachada de escola técnica em Itapetininga (SP)
Pâmela Beker/g1
Em pesquisa sobre os azulejos, Monica descobriu que Antonio Paim Vieira também foi o responsável pela decoração da Igreja Nossa Senhora do Brasil, localizada no Jardim América, em São Paulo. As peças retratam uma cena de trabalho com a terra, na qual um homem aparece preparando o solo usando tração animal.
Conforme Monica, a pintura também faz referência à realidade dos trabalhadores do campo naquela época. Apesar das inovações tecnológicas já existirem, como tratores, elas ainda não eram difundidas, especialmente para os pequenos produtores. A obra também traz um anacronismo, já que se trata de uma instituição em que a tecnologia deveria estar em evidência.
Segundo a professora, Antonio era um artista plástico nacionalista e chegou a participar da Semana de Arte Moderna em 1922. Ele costumava retratar o que via e não tentava mascarar a realidade de sua época.
A técnica utilizada nos azulejos foi objeto de pesquisa por muito tempo antes de ser colocada em prática, o que acabou o tornando reconhecido. Também produziu vitrais para igrejas. Na época, o governo Getúlio Vargas convidou o artista para fazer as obras na fachada da unidade da escola técnica.
Monica contou que começou a trabalhar no local em 2007 e escolheu a unidade como tema de sua pesquisa para o projeto de conclusão do mestrado, se aprofundando no assunto.
“O objetivo da pesquisa é servir como um serviço para ajudar a comunidade. Cada um contava uma coisa [sobre a história da unidade]. Eu fui atrás e foi muito difícil, fui juntando material. Dá para fazer mais pesquisa e tem muito assunto para verificar, o que o local significa para as pessoas”, relembrou a professora.
Ela comentou que, devido ao local ser afastado, poucas pessoas o visitam e criam essa curiosidade. Ela já conhecia a escola, mas foi trabalhando nela que conseguiu conhecer mais profundamente sobre o seu passado. E já passa o legado adiante: seu filho também estudou na Etec.
“Gosto de fazer parte, mas sentia que precisava contribuir com a sociedade, valorizar nossa história e compreender a região de Itapetininga. Esse trabalho tem a função de ajudar as pessoas a entenderem sua história”, completou.
Prédio erguido há 80 anos
Conforme a pesquisa de Monica, o prédio foi construído durante o Estado Novo, nome dado ao governo de Getúlio Vargas, durante os anos de 1940, para servir como Escola Prática de Agricultura para formação profissional dos filhos de trabalhadores rurais, e recebeu o nome de Carlos Botelho. A arquitetura usada foi o estilo neocolonial tradicional.
A escola foi construída em uma planta em formato de avião, projeto feito pelo arquiteto conhecido como Dr. Bezerra, participante do extinto Departamento Agrícola. A unidade tem 24 mil metros quadrados e conta com uma placa de bronze com a data de sua inauguração: 5 de junho de 1945.
O local possui uma área estimada em 147 alqueires e, ao redor do prédio principal, existem outros ambientes, como: casa do diretor, matas e pastos de gado de corte, curral de bovinos, aviário, barracão de máquinas agrícolas, quadra aberta, coelheira, estufas, pasto e instalações para caprinos e ovinos. Um pouco mais distante, estão as pocilgas e estábulos para ordenha das vacas de leite e a vila residencial para funcionários, além do apiário, horta e pomar.
Em dezembro de 1956, o local deixou de ser uma instituição de ensino agrícola e se tornou um Instituto Penal Agrícola.
Nos anos seguintes, sofreu diversas mudanças: em 1965, se transformou em um local para abrigar menores carentes; no ano de 1970, virou a Fundação Estadual para o Bem Estar do Menor (Febem); e em 1989 voltou a ser uma unidade escolar, atuando como a Escola Técnica Estadual Professor Edson Galvão. Entre 1997 e 2005, o local foi ocupado por integrantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), que lutavam pela reivindicação das áreas da região para assentamento.
Na pesquisa, Monica também relatou que uma parte da estrutura original da unidade está abandonada e parcialmente destruída, estando interditada e em ruínas. Mas ressaltou que existe um projeto de reforma de pelo menos uma dessas instalações, para ampliação das salas de aulas e alojamentos, devido à demanda por mais espaço na escola.
A escola não é parecida com outras unidades de ensino, pois, segundo a professora, não tem muros e nem grades como outros edifícios escolares urbanos, o que pode causar uma sensação de liberdade aos funcionários e alunos. Por estar em uma fazenda rodeada de área verde, acaba sugerindo paz e harmonia, mesmo sofrendo problemas como as outras instituições de educação.
Reportagem visitou a escola técnica
O diretor da escola, Renato Walter, informou que atualmente o local conta com 1.250 estudantes, sendo 62 deles alojados no local. São mais de dez cursos, como agropecuária, nutrição e dietética, agronegócio, administração, meio ambiente e etc. Ao todo, são 19 salas, contando com laboratórios de química, vegetais, leite, carne, informática e outros.
Na visita à unidade, Renato compartilhou que está em busca de recursos financeiros e apoio para recuperar o fundo da unidade e tem planos de usar o espaço para expansão do refeitório, salas de aula e laboratórios, conseguindo, assim, atender mais pessoas.
Renato atua há seis anos como diretor da unidade, mas ainda tem mais dois anos no cargo. Para ele, é gratificante ver o trabalho desenvolvido e o sorriso dos estudantes e responsáveis, também conseguindo atender a necessidade do mercado de trabalho.
“Eu desejo ainda [nos próximos dois anos] a concretização da melhoria na infraestrutura. Meu sonho é ver os três prédios funcionando e que os alunos colham os frutos no mercado de trabalho”, disse.
Etec Professor Edson Galvão foi fundada em 1945 e tem azulejos pintados por um artista plástico paulista
Carla Monteiro/g1
Informações dos azulejos pintados à mão que ficam na fachada da Etec Professor Edson Galvão em Itapetininga
Pâmela Beker/g1
Placa de bronze com as informações da fundação da Etec de Itapetininga (SP)
Carla Monteiro/g1
Plantação de mexerica feita por alunos da Etec Professor Edson Galvão em Itapetininga
Pâmela Beker/g1
*Colaborou sobsupervisão de Eric Mantuan
Veja mais notícias no g1 Itapetininga e Região
VÍDEOS: assista às reportagens da TV TEM