
Seara Praia Hotel, na orla de Fortaleza, vai ser demolido e substituído por torre de luxo.
A Avenida Beira-Mar, uma das principais vias turísticas de Fortaleza (CE), assistirá pelos próximos dez meses à demolição do Seara Praia Hotel, edifício de 25 andares que abrigou o estabelecimento por 40 anos. Esta será das maiores demolições mecânicas de um prédio em altura já realizadas no Estado, segundo o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (CREA-CE).
🚧O início dos trabalhos ocorreu neste mês de agosto, sete meses após o encerramento das atividades do antigo hotel. O tradicional prédio da orla da capital cearense será demolido para a construção de outro prédio: o Mansão Seara, edifício residencial.
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As dimensões da futura nova estrutura, um edifício de luxo, chamam atenção: 50 andares e 172 metros de altura.
O tamanho é bem acima do que é permitido pelo Plano Diretor de Fortaleza, de 72 metros. Contudo, o Estatuto da Cidade de Fortaleza traz instrumentos que podem permitir a construção acima do limite, desde que haja o pagamento de uma contrapartida ao município.
A prefeitura de Fortaleza confirmou que a construção do prédio de 50 andares foi aprovada em dezembro de 2024 por meio desses instrumentos.
Especialista ouvido pelo g1 alerta para impactos ambientais e sociais desse tipo de construção. (leia mais abaixo)
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Arte/g1
🔎Demolições mecânicas não usam explosões ou implosões para derrubada de estruturas e têm a possibilidade de reaproveitamento do entulho, além de não afetarem o trânsito e estruturas vizinhas.
Mas como funciona uma demolição de grande porte como essa? E quais os impactos da construção de um prédio tão alto na orla de Fortaleza? Confira abaixo os detalhes.
➡️Demolição por etapas
As etapas iniciais da demolição do Hotel Seara envolvem o desmonte interno da estrutura, com a retirada de portas, janelas, esquadrias e demais elementos construtivos, preparando o edifício para a fase estrutural da demolição.
Neste momento, segundo Magalhães Demolição, responsável pelo desmonte, equipes preparam o canteiro para receber o pesado maquinário e as obras devem começar nos próximos dias.
“Toda a operação será realizada de forma mecânica e manual, com o apoio de maquinários modernos como escavadeiras, guindastes e rompedores de longo alcance, que permitem alcançar e operar até o topo do prédio com precisão milimétrica.”, explicou a Magalhães Demolição em nota.
O edifício será telado por completo e receberá bandejas de proteção para conter possíveis detritos. A empresa informou que vai implementar medidas de controle de poeira, ruídos e impacto ambiental durante toda a execução dos serviços, mas não detalhou quais medidas são essas.
Ainda de acordo com a Magalhães Demolição, não há previsão de interferências no trânsito em vias públicas durante a execução do processo de demolição.
A demolição do edifício deve durar em torno de dez meses, não contará com implosão e “haverá reaproveitamento do entulho gerado pela obra”. A empresa que faz o serviço é a mesma que realizou a demolição de outro prédio histórico da cidade, o Edifício São Pedro.
O Seara Praia Hotel anunciou o encerramento de suas atividades comerciais em 31 de janeiro deste ano
Demolição começa neste mês, de acordo com a empresa que presta o serviço.
Thiago Gadelha/Sistema Verdes Mares (SVM)
Neste momento, as equipes preparam o canteiro de obras.
Thiago Gadelha/Sistema Verdes Mares (SVM)
➡️Novo prédio vai além do permitido em plano diretor
O prédio residencial que vai substituir o Seara Praia Hotel vai ter uma vista de 180° da orla, incluindo a Praia de Iracema e a enseada do Mucuripe.
O empreendimento será composto por 74 unidades, com apartamentos de 350 m², dois por andar, que terão vista de 180º, e oito lajes exclusivas de 661 m², com vista de 360º. Ele também contará com um heliponto.
No entanto, um ponto se destaca nessa história: o novo prédio ultrapassa o limite estabelecido pelo Plano Diretor de Fortaleza para a construção de edifícios em algumas áreas que fazem parte da orla da cidade, como trechos do Meireles, Mucuripe e Aldeota.
🟢 De acordo com a última atualização do Plano Diretor, aprovado em 2009, a altura máxima a ser praticada a partir daquela data é de 72 metros [cerca de 24 andares]. O Mansão Seara deverá ter 172 metros, ultrapassando o permitido.
Por meio de nota, a Secretaria do Urbanismo e Meio Ambiente (Seuma) explicou que a construção de prédios de qualquer altura é aprovada mediante cumprimento de requisitos da legislação vigente, e, ainda, da aprovação do Comando da Aeronáutica (Comaer), responsável pelo gerenciamento do espaço aéreo.
Hotel tradicional de Fortaleza dará lugar a prédio residencial de luxo
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➡️Como foi autorizado?
A construção de prédios gigantes na orla de Fortaleza tornou-se possível, principalmente, a partir de dois instrumentos urbanísticos: a Outorga Onerosa do Direito de Construir e a Outorga de Alteração de Uso, aprovados em 2015 após alteração no plano diretor. Entenda os conceitos:
Essas outorgas ajudam a ‘abrir uma brecha’ no plano diretor do município. Elas estão previstas no Estatuto da Cidade e permitem aos proprietários de terrenos construírem acima do potencial construtivo básico estabelecido mediante o pagamento de uma contrapartida financeira ao município.
A Outorga de Alteração de Uso, caso do Mansão Seara, permite mudar o uso do solo de um imóvel. Antes, a área compreendia um hotel na cidade, mas agora será um prédio residencial.
No caso do Mansão Seara, essa contrapartida foi de R$ 39.417.648,06, conforme verificado pelo g1 no site oficial da Prefeitura de Fortaleza.
Ou seja: quando o projeto do Mansão foi apresentado, a prefeitura verificou que ele não cumpria alguns critérios, como a altura e taxa de ocupação do solo. A construtora responsável, portanto, precisa pagar um “excedente” para tornar a construção legal.
Em teoria, esse dinheiro deve ser investido na própria cidade e em áreas prioritariamente de menor Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM), ajudando na implantação de equipamentos urbanos e comunitários e criação de espaços públicos de lazer e áreas verdes.
Marcelo Capasso, arquiteto e urbanista, mestre em gestão urbana, doutor em geografia e pesquisador do Laboratório de Estudos da Habitação da Universidade Federal do Ceará (UFC) aponta, no entanto, uma contradição. Segundo o especialista, a Outorga de Alteração de Uso contradiz o Plano Diretor de Fortaleza ao permitir a alteração dos parâmetros de construção (como altura e recuo), que deveriam ser fixos.
Na prática, isso significa que o tamanho do novo prédio é limitado principalmente pelo que o construtor pode pagar e não por um planejamento urbano.
“Isso é um problema jurídico, porque o plano diretor, em tese, seria a lei que deveria reger esses limites. Mas entra essa ordem de operação de uso e diz que, se pagar, pode. Você pode comprar altura a mais, você pode comprar recuo a menos, você pode comprar taxa de ocupação a menos. Na prática significa que esses prédios podem ter [de altura] até quanto a pessoa puder pagar”, pontuou o especialista.
Grandes prédios chamam atenção na orla de Fortaleza.
Eduardo Queiroz/SVM
➡️Impactos sociais e ambientais
Marcelo alerta que os efeitos de grandes demolições e construções às margens da praia são inúmeros e poderão ser ainda maiores a longo prazo.
O impacto mais óbvio, segundo ele, é o visual. Passear pelo calçadão da Avenida Beira-Mar, por exemplo, tornou-se um ‘esticar’ de pescoço para poder olhar os edifícios gigantes que constituem a orla.
Mas há outros impactos. Os grandes prédios também mudam como o vento circula pela cidade, tornando-se “barreiras”, e afetam até mesmo o trânsito na cidade, já que com mais prédios e apartamentos, chegam mais carros para circular pelas ruas.
“Impacto no sistema hoteleiro também, [que sofre] uma substituição paulatina dessa demanda pelas plataformas [e aluguel por temporada]. Outra coisa é que o perfil do consumidor vai ficar cada vez mais especializado naqueles que estão dispostos a pagar caríssimo. Você vai definindo, acentuando o processo de segregação. Prédios mais antigos são mais baratos, então são mais acessíveis. Quando começo a substituir, eu vou condicionando o tipo de consumo”, disse Marcelo ao g1.
O único interesse ali é realmente você fazer a atualização do valor do solo, no sentido de atualizar o produto que vai ter ali em cima e pelas possibilidades agora abertas pela valorização que ocorreu no solo nos últimos 10 anos. Inclusive, a reforma da Beira-Mar foi uma delas. A gente não pode deixar de levar em consideração isso. Essa reforma da Beira-Mar potencializou exatamente essa acentuação da captura da renda fundiária, da captura do valor do solo naquela região. Isso aí é uma coisa muito importante
O que diz a prefeitura
A prefeitura confirmou que a construção do prédio de 50 andares no lugar do Seara Praia Hotel, localizado à avenida Beira Mar, foi aprovada por meio do processo de autorização do instrumento de Outorga Onerosa de Alteração de Uso (OOAU), ocorrido em dezembro de 2024.
“É importante ressaltar que a aprovação da outorga não se traduz em aprovação imediata da construção do empreendimento, uma vez que, após liberação do instrumento, a empresa segue com a tramitação de processos junto à Seuma para a liberação definitiva da construção, que requer expedição de alvará de construção, licenciamento ambiental e o próprio pagamento da outorga. Durante a tramitação dos processos, são avaliados possíveis impactos ambientais, a partir da apresentação de projetos ou estudos complementares do empreendimento”, disse a Seuma.
Plano diretor em revisão
O Plano Diretor Participativo e Sustentável de Fortaleza passa por uma revisão desde o último dia 2 de agosto. De acordo com a prefeitura, até o momento foram elencados dois temas: “Áreas de Risco Climático”, com condução da Defesa Civil, e “Ambiente Natural”, apresentado pela Seuma, em parceria com o Instituto de Pesquisa e Planejamento de Fortaleza (Ipplan).
O novo plano propõe a ampliação da área verde protegida em Fortaleza. Se o documento for aprovado, a medida vai ampliar em 64,3% as áreas de preservação ambiental na capital cearense.
Foram destacados temas como zoneamento do ambiente natural da cidade, áreas verdes, parques e microparques; com novidades incorporadas na proposta, como agroecologia urbana, biodiversidade marinha e costeira, conectores verdes e corredores ecológicos, águas urbanas e emergência climática.
📝 Confira o calendário de reuniões:
1° Ciclo de Audiências
Data: 23/8 – Tema: Ambiente Construído (zeis, habitação, zonas urbanas)
Data: 30/8 – Tema: Centralidades (patrimônio, polos e eixos)
2° Ciclo de Audiências
Data: 13/9 – Tema: Macrozona do Ambiente Natural
Data: 20/9 – Tema: Macrozona do Ambiente Construído
Data: 27/9 – Tema: Macrozona de Centralidades
Data: 4/10 – Tema: Governanças, Sistemas e Indicadores
Conferência da Cidade
Data: 24 a 26/10 – Tema: Para validação das propostas das Audiências Públicas e elaboração da minuta da lei
Especialista avalia a construção de grandes prédios na orla de Fortaleza.
Thiago Gadelha/Sistema Verdes Mares (SVM)