Registro de gavião-de-penacho no Pontal do Paranapanema reforça valor da restauração na Mata Atlântica


Registro de gavião-de-penacho reforça valor da restauração na Pontal do Paranapanema
Na imensidão verde do Pontal do Paranapanema, na região do município de Presidente Prudente (SP), um visitante ilustre foi flagrado por câmeras de monitoramento: o gavião-de-penacho (Spizaetus ornatus), uma das aves de rapina mais raras da Mata Atlântica.
O registro é uma conquista para os conservacionistas de projetos como Programa de Conservação do Mico-Leão Preto e Corredores de Vida , ambos do Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ), e sinaliza algo grandioso: a floresta está viva novamente.
Classificado como criticamente ameaçado de extinção no estado de São Paulo, o gavião-de-penacho é conhecido por seu porte imponente e hábitos florestais “exigentes”. Como predador de topo de cadeia, a espécie só pode ser encontrada onde o ecossistema está bem equilibrado, com vegetação densa e fauna abundante.
Gavião-de-penacho registrado no Pontal do Paranapanema
Programa de Conservação do Mico-Leão Preto
Não foi a primeira vez que a equipe registrou a ave. Em 2023, gravadores de áudio instalados no Parque Estadual do Morro do Diabo também capturaram sua vocalização. Até aquele momento, a espécie não tinha flagrantes no fragmento em questão.
“É o gavião-de-penacho predando, ao que tudo indica, um gambá. O gavião-de-penacho é uma espécie ameaçada na Mata Atlântica, geralmente encontrada em florestas conservadas. Sua presença nesse fragmento é um bom indicador sobre o processo de restauração florestal”, escreve o IPÊ em sua rede social.
“Aves de rapina como esta são, em geral, sensíveis à perda e fragmentação de habitat. Devido à sua ampla mobilidade, baixa densidade populacional e exigências específicas de habitat, são consideradas espécies ‘guarda-chuva’. Ou seja, sua proteção contribui para a conservação de diversas outras espécies e dos processos ecológicos associados”, explica Carolina Biscola, responsável pelo monitoramento CCB do projeto Corredores de Vida.
“Esse registro reforça a importância de preservar mesmo pequenos fragmentos de vegetação nativa, que podem funcionar como refúgios para espécies raras e ameaçadas, além de atuar como áreas-chave para a conectividade e a conservação regional da biodiversidade”, completa a bióloga e ornitóloga Ana Laura Campioto, que também integra o projeto.
Corredor de vida para o futuro
O avistamento foi feito graças ao sistema de câmeras e gravadores de áudio instalados nos corredores ecológicos, que ligam áreas isoladas da Mata Atlântica às unidades de conservação Parque Estadual Morro do Diabo e Estação Ecológica Mico-leão-preto (ESEC MLP).
Ao todo, o projeto batizado de “Mapa dos Sonhos” já plantou 10,8 milhões de árvores nativas em 5,1 mil hectares.“A meta é restaurar 75 mil hectares prioritários, dentre os mais de 260 mil hectares de passivos ambientais no Pontal, até 2041 – com a remoção de 29 milhões de toneladas de CO² da atmosfera”, afirma Carolina.
O projeto Corredores de Vida é realizado desde 2002 pelo IPÊ
Laurie Hedges
Na prática, o plano busca conectar fragmentos florestais por meio de parcerias com proprietários rurais. As áreas, que antes estavam degradadas, agora servem como rotas seguras para animais ameaçados de extinção.
Nas áreas restauradas, os pesquisadores já identificaram 22 espécies de mamíferos de médio e grande porte, como onça-pintada (Panthera onca), onça-parda (Puma concolor) e gato-mourisco (Herpailurus yagouaroundi).
Também foram registradas espécies consideradas vulneráveis pela IUCN. Dentre elas, anta-brasileira (Tapirus terrestris), lobo-guará (Chrysocyon brachyurus), gato-do-mato-pequeno (Leopardus guttulus) e tamanduá-bandeira (Myrmecophaga tridactyla), além de 136 espécies de aves, incluindo udu-de-coroa-azul (Momotus momota) e inhambu-chororó (Crypturellus parvirostris).
Udu-de-coroa-azul (Momotus momota)
danielvolpin / iNaturalist
Somando as áreas restauradas e unidades de conservação, o grupo de pesquisadores identificou 219 espécies de aves e 34 espécies de mamíferos. “Isso é a prova de que se trata de fato de trazer a floresta de volta. Os animais de topo de cadeia aprovaram esse trabalho”, destaca Laury Cullen, diretor de projetos do IPÊ.
Articulação para proteger
O sucesso dos Corredores de Vida não acontece por acaso. A conexão entre fragmentos de mata nativa depende de um trabalho intenso de articulação entre o IPÊ e proprietários rurais da região. Com base no que determina o Novo Código Florestal, cada propriedade deve manter ao menos 20% de cobertura nativa e é essa exigência foi o que abriu espaço para o projeto “Mapa dos Sonhos”.
A proposta organiza estrategicamente essas áreas de reserva legal de forma que se conectem entre si e aos grandes remanescentes florestais da região, como o Parque Estadual Morro do Diabo (PEMD) e a Estação Ecológica Mico-Leão-Preto (ESEC MLP).
Estação Ecológica Mico-Leão-Preto está localizada no bioma Mata Atlântica
Divulgação / Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
Tudo é feito com apoio jurídico e diálogo direto com os produtores. Ao ceder parte de sua terra para o reflorestamento, o proprietário se adequa à lei ambiental e ainda contribui para a formação de corredores ecológicos, essenciais para a biodiversidade.
“A sustentabilidade do projeto está fortemente ligada à manutenção dos recursos financeiros. Nesse sentido, destacamos as parcerias com o governo do estado de São Paulo, por meio do Programa Nascentes, relata Cullen.
Resultados e metas
Além de plantar milhões de árvores, o projeto Corredores de Vida também colhe resultados concretos. Pesquisas realizadas com análise de DNA ambiental mostram que os solos e córregos das áreas restauradas estão ganhando vida: bactérias, fungos, insetos e vertebrados típicos de florestas saudáveis estão reaparecendo.
Esse tipo de monitoramento ajuda os pesquisadores a traçar a “trajetória ecológica” das áreas reflorestadas, comparando-as com matas bem preservadas.
Outra frente do projeto é a compensação de carbono. Com a meta de restaurar 6 mil hectares até 2026, em parceria com a farmacêutica AstraZeneca, o IPÊ espera capturar cerca de 2,4 milhões de toneladas de CO₂ até 2056. A iniciativa também gera empregos e renda local, envolvendo viveiristas, pequenos produtores e empresas florestais.
VÍDEOS: Destaques Terra da Gente
Veja mais conteúdos sobre a natureza no Terra da Gente
Adicionar aos favoritos o Link permanente.